domingo, 30 de novembro de 2008

1.6 O ATO COMUNICATIVO JURÍDICO

O ato comunicativo ocorre quando há cooperação entre os interlocutores. O emissor possui o pensamento e busca a expressão verbal para fazê-lo conheci­do no mundo sensível (direção onomasiológica); o receptor possui a expressão verbal e caminha em direção ao pensamento, com o propósito de compreender a mensagem (direção semasiológica).
A linguagem representa o pensamento e funciona como instrumento me­diador das relações sociais. As variações socioculturais contribuem para diversifi­cações da linguagem, só não sendo mais graves as dificuldades em razão do es­forço social de uma linguagem comum, controlada por normas lingüísticas.
No mundo jurídico, o ato comunicativo não pode enfrentar à solta o pro­blema da diversidade lingüística de seus usuários, porque o Direito é uma ciência que disciplina a conduta das pessoas, portanto, o comportamento exterior e obje­tivo, e o faz por meio de uma linguagem prescritiva e descritiva.
Assim, quando os interesses se mostram conflitantes ou uma ação huma­na fere os valores da norma jurídica, exigindo reparação dos mesmos, forma-se a lide (litem > lite > lide = conflito), criando um novo centramento na relação entre os interlocutores processuais: a polêmica. No confronto de posições, a linguagem torna-se mais persuasiva por perseguir o convencimento do julgador que, por sua vez, resguarda-se da reforma de sua decisão, explicando, na motivação da sentença, os mecanismos racionais pelos quais decide.
O ato comunicativo jurídico não se faz, pois, apenas como linguagem en­quanto língua (conjunto de probabilidades lingüísticas postas à disposição do usuário), mas também, e essencialmente, como discurso, assim entendido o pen­samento
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organizado à luz das operações do raciocínio, muitas vezes com estrutu­ras preestabelecidas, e. g., as peças processuais.
O ato comunicativo jurídico não é, porém, Lógica Formal, como pode su­por uma conclusão apressada.
Exemplifique-se pelo silogismo non sequitur:
Todo criminoso ronda a loja a ser assaltada, antes do crime.
Pedro é criminoso e rondou a loja X, que foi assaltada.
Logo, Pedro assaltou a loja X.
A ação criminosa de Pedro é tão-somente suposição apoiada em meros indícios que não têm força condenatória.
Embora o estatuto do pensamento jurídico não seja a Lógica Formal, não pode prescindir das regras do silogismo lógico. As partes processuais organizam suas opiniões com representação simbólica que possa ser aplicada ao mundo real, demonstrando a possibilidade de correspondência entre motivo e resultado.
A "realidade" do raciocínio lógico não pode ser afirmada com certeza ab­soluta nem mesmo se presente estiver a rainha das provas: a confissão (confessio est regina probationum), porque alguém pode ter o animus necandi (intenção de matar), atirar contra o alvo pretendido e o resultado morte pode não ser conse­qüência direta de sua conduta dolosa, exigindo-se prova argumentativa da exis­tência do nexo causal ação/resultado.
O ato comunicativo jurídico, conclui-se, exige a construção de um discur­so que possa convencer o julgador da veracidade do "real" que pretende provar. Em razão disso, a linguagem jurídica vale-se dos princípios da lógica clássica para organização do pensamento.
O mundo jurídico prestigia o vocabulário especializado, para que o exces­so de palavras plurissignificativas não dificulte a representação simbólica da lin­guagem.O discurso jurídico constrói uma linguagem própria que, no dizer de Miguel Reale (1985:8), é uma linguagem científica

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