Infalibilidade do Papa
Segundo Pierre d'Angkor345, o erro da Igreja Romana foi ter identificado a
noção de Autoridade com a de Infalibilidade.
É o sofisma que J. J. Rousseau denunciou, dizendo que é, em suma, a
própria igreja que decide que ela tem o direito de decidir, sem apelação.
A elevação de um homem a uma potencialidade divina, além de ser do
mais puro Paganismo, é equivalente à pretensão da rã em querer se elevar ao
tamanho do boi.
"A Igreja católica, diz Mater346, por instinto de
conservação, não achou meio melhor de defesa que o de uma
forte centralização e de um regime autocrata e autoritário, que
pudesse aparar os possíveis golpes de um cisma político
cultural, ético e, principalmente, dogmático, graças a uma
rigorosa uniformidade de direções e de decisões emanadas de
várias Congregações eclesiásticas, cúrias, bispos etc., sujeitas
todas ao Papa Negro, o Geral dos Jesuítas. Segundo as leis
trágicas dos destinos humanos, essa centralização de todos os
Poderes, temporal e espiritual, constitui sem dúvida alguma o
maior perigo para a própria Igreja”.
“A razão é que, dos domínios da Onipotência e dos
da Infalibilidade sem base dogmática, que residem no Papa,
bajulado dia e noite, por finórios canonistas, padres e jesuítas
345 Le Catholicisme et l'Avenir religieux, 1929.
346 O Geral dos Jesuítas Pio XI e o caso Bremer — 1932 — "Um escandaloso processo eclesiástico".
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de todo jaez, de consciência e de liberdade algemadas, resulta,
sem contestação, o absolutismo e o despotismo que, por isso
mesma afasta o Pontífice da doutrina do fundador da igreja".
A infalibilidade do papa foi decretada em 1870 por um Concilio presidido
pelo próprio interessado Pio IX e ardentemente preparado para este fim pela
"Companhia de Jesus*", apesar da oposição feita por alguns bispos e, sobretudo, de
Bjakovo, o Revmo. Strossmayer, cujo discurso, embora um tanto longo, convidamos
o leitor a assistir, comodamente sentado em uma das poltronas daquela magna
Assembléia, a fim de melhor ouvir as verdades nuas e cruas, que vão ser ditas
naquele Cenáculo, por um dos seus mais eminentes membros e possa ajuizar do
espírito ambicioso dos partidários que, com essa aprovação, preparavam a
possibilidade de galgar um dia uma cadeira pontificai inatacável.
É bom notar desde já que nem esse bispo nem seus partidários foram
condenados ou excomungados pelo referido Papa por ter desmascarado aquele
antro de perdição que é o Vaticano e nem seus argumentos foram jamais refutados.
Tem a palavra o bispo Strossmayer:
"Veneráveis padres e irmãos: Não sem temor, porém
com uma consciência livre e tranqüila, ante Deus que nos julga,
tomo a palavra nesta augusta assembléia.”
“Prestei toda minha atenção aos discursos que se
pronunciaram nesta sala e anseio por um raio de luz, que,
descendo de cima, ilumine minha inteligência e me permita
* N. do E.: Acerca da Companhia de Jesus, ver também As Instruções Secretas dos Jesuítas, de
Charles Sauvestre, Madras Editora.
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votar os cânones deste Concilio Ecumênico, com o perfeito
conhecimento de causa”.
“Compenetrado da minha responsabilidade, pela
qual Deus me pedirá contas, estudei com a mais escrupulosa
atenção os escritos do Antigo e Novo Testamento e interroguei
esses veneráveis monumentos da Verdade, se o Pontífice que
preside aqui é verdadeiramente o sucessor de São Pedro,
vigário de Cristo e infalível dentro da Igreja”.
“Transportei-me aos tempos em que ainda não
existiam o ultramontanismo e o galicanismo, em que a Igreja
tinha por doutores: S. Paulo, S. Pedro, S. Tiago e S. João, dos
quais não se pode negar a autoridade divina, sem pôr em
dúvida o que a Santa Bíblia nos ensina, Santa Bíblia que o
Concilio de Trento proclamou ser a regra da fé e da moral. Abri
essas sagradas páginas e sou obrigado a dizer-vos: nada
encontrei que sancione, próximo ou remotamente, a opinião
dos ultramontanos! E maior é minha surpresa quando,
naqueles tempos apostólicos, nada há que fale de papa
sucessor de S. Pedro e vigário de Jesus Cristo!
“Vós, monsenhor Mannig, direis que blasfemo; vós,
monsenhor Pio, direis que estou demente! Não, monsenhor,
não blasfemo, nem perdi o juízo! Tenho lido todo o Novo
Testamento, declaro ante Deus e com a mão sobre o crucifixo
que nenhum vestígio encontrei do papado. Não me recuseis
vossa atenção, meus veneráveis irmãos! Com vossos
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murmúrios e interrupções justificais os que dizem, como o
padre Jacinto, que este Concilio não é livre; se assim for, tende
em vista que essa augusta assembléia, que prende a atenção
de todo o mundo, cairá no mais terrível descrédito”.
“Agradeço a S. Ex. Monsenhor Dupanloup o sinal de
aprovação que me fez com a cabeça; isso me alenta e me faz
prosseguir”.
“Lendo, pois, os Santos Livros, não encontrei um só
capítulo, um só versículo que dê a São Pedro a chefia sobre os
apóstolos”.
“Não só o Cristo nada disse a respeito deste ponto,
mas, ao contrário, prometeu tronos a todos os apóstolos
(Mateus XIX, 28) sem dizer que o de Pedro seria mais elevado
que o dos outros. Que diremos do seu silêncio?”
“A lógica nos ensina a concluir que o Cristo nunca
pensou em elevar Pedro à chefia do Colégio Apostólico”.
“Quando o Cristo enviou seus discípulos a
conquistar o mundo, a todos — igualmente — fez a promessa
do Espírito Santo”.
“Dizem as Santas Escrituras que até proibiu a Pedro
e a seus colegas de reinarem ou exercerem senhorio (Lucas
XXIII, 25, 26)”.
“Se Pedro fosse eleito Papa, Jesus não diria isso,
porque, segundo nossa tradição, o papado tem uma espada
em cada mão, simbolizando os poderes espiritual e temporal”.
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“Ainda mais: se Pedro fosse papa ou chefe dos
apóstolos, permitiria que esses seus subordinados o
enviassem, com João, à Samaria para anunciar o Evangelho
do filho de Deus? (Atos VIII, 14)”
“Que direis vós, veneráveis irmãos, se nos
permitíssemos agora mesmo mandar Sua Santidade Pio IX,
que aqui preside, e Sua Eminência Monsenhor Plantier, ao
patriarca de Constantinopla para convencê-lo de que deve
acabar com o cisma do Oriente? O símile é perfeito, haveis de
concordar. Mas, temos coisa ainda melhor.”
“Reuniu-se em Jerusalém um Concilio ecumênico
para decidir questões que dividiam os fiéis”.
“Quem devia convocá-lo? Sem dúvida Pedro, se
fosse papa. Quem devia presidi-lo? Por certo que Pedro. Quem
devia formular e promulgar os cânones? Ainda Pedro. Não é
verdade?”
“Pois bem: nada disso sucedeu! Pedro assistiu ao
Concilio com os demais apóstolos sob a direção de Tiago!
(Atos XV).”
“Assim, parece-me que o filho de Jonas não era o
primeiro, como sustentais. Encarado agora, por outro lado,
temos: enquanto ensinamos que a Igreja está edificada sobre
Pedro, São Paulo (cuja autoridade devemos todos acatar) diznos
que ela está edificada sobre o fundamento da fé dos
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apóstolos e profetas, sendo a principal pedra do ângulo Jesus
Cristo (Epístola dos Efésios II, 20).”
“Esse mesmo Paulo ao enumerar os ofícios da Igreja
menciona os apóstolos, profetas, evangelistas e pastores; e
será crível que o grande apóstolo dos gentios se olvidasse do
papado, se este existisse? Esse olvido me parece tão
impossível como o de um historiador desse Concilio que não
fizesse menção da Sua Santidade Pio IX. (Apartes: Silêncio,
herege! Silêncio!)”
“Acalmai-vos, veneráveis irmãos, porque ainda não
concluí. Impedindo-me de prosseguir, provareis ao mundo que
sabeis ser injustos, tapando a boca do mais pequeno membro
dessa assembléia. Continuarei”:
“O apóstolo Paulo não faz menção em nenhuma de
suas Epístolas às diferentes igrejas, da primazia de Pedro, se
esta existisse e se ele fosse infalível como quereis, poderia
Paulo deixar de mencioná-la, em longa Epístola acerca de tão
importante ponto?”
“Concordai comigo: A Igreja nunca foi mais bela,
mais pura e mais santa que naquele tempo em que não tinha
papa. (Apartes: Não é exato! Não é exato!)”
“Por que negais, Monsenhor Laval? Se algum de
vocês,' meus veneráveis irmãos, se atreve a pensar que a
Igreja que hoje tem um papa (que vai ficar infalível) é mais
firme na fé e mais pura na moralidade que a Igreja Apostólica,
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diga-o abertamente ante o Universo, visto como este recinto é
um centro do qual nossas palavras voam de pólo a pólo! Calaivos?
Então continuarei.”
“Também nos escritos de São Paulo, de São João
ou de São Tiago, não descubro nenhum traço do poder papal!
São Lucas, o historiador dos trabalhos missionários dos
apóstolos, guarda silêncio a respeito de tal assunto! Isso deve
preocupar-vos muito. Não me julgueis um cismático!”
“Entrei pela mesma porta que vós outros; meu título
de bispo me deu direito a comparecer aqui e minha
consciência, inspirada no verdadeiro Cristianismo, obriga-me a
dizer-vos o que julgo ser verdade”.
“Pensei que se Pedro fosse vigário de Jesus Cristo
ele não o sabia, pois nunca procedeu como papa; nem no dia
do Pentecostes, quando pregou seu primeiro sermão, nem no
Concilio de Jerusalém, presidido por São Tiago, nem da
Antioquia nem nas Epístolas que dirigiu às igrejas. Será
possível que ele fosse papa sem o saber?”
“Parece-me escutar de todos os lados: São Pedro
não esteve em Roma? Não foi sacrificado de cabeça para
baixo? Não existem os lugares onde ensinou e os altares em
que disse missa nessa cidade?”
“E eu responderei: Só a tradição, veneráveis irmãos,
é que nos diz ter São Pedro estado em Roma; e como a
590
tradição é tão-somente a tradição da sua estada em Roma. É
com ela que me provareis seu episcopado e sua supremacia?”
“Scaligero, um dos mais eruditos historiadores, não
vacila em dizer que o episcopado de São Pedro e sua
residência em Roma devem ser classificados no número das
lendas ridículas! (Repetidos gritos e apartes: tapai-lhe a boca;
fazei-o descer dessa cadeira!)”
“Meus veneráveis irmãos, não faço questão de calarme
como quereis, mas não será melhor provar todas as coisas
como manda o apóstolo e crer só no que for bom? Lembrai-vos
que temos um ditador ante o qual todos nós, mesmo Sua
Santidade Pio IX, devemos curvar a cabeça! Esse ditador, vós
bem o sabeis, é a História!”
“Permite que repita: folheando os sagrados escritos
não encontrei o mais leve vestígio do papado nos tempos
apostólicos!”
“E, percorrendo os anais da Igreja, nos quatro
primeiros séculos, o mesmo me sucedeu! Confessar-vos-ei que
o que encontrei foi o seguinte: Que o grande Santo Agostinho,
bispo de Hipona, honra e glória do Cristianismo e secretário do
Concilio de Melive, nega a supremacia do bispo de Roma.”
“Que os bispos da África, no sexto Concilio de
Cartago, sob a presidência de Aurélio, bispo dessa cidade,
admoestavam a Celestino, bispo de Roma, por supor-se
591
superior aos demais bispos, enviando-lhes comissionados e
introduzindo o orgulho na Igreja.”
“Que, portanto, o papado não é instituição divina.
Deveis saber, meus veneráveis irmãos, que os padres do
Concilio de Calcedônia colocaram os bispos da antiga e nova
Roma na mesma categoria dos demais bispos. Que aquele
sexto Concilio de Cartago proibiu o título de 'Príncipe dos
Bispos', por não haver soberania entre eles.”
“E que São Gregório I escreveu estas palavras que
muito aproveitam a tese: Quando um patriarca se intitula 'Bispo
Universal', o título de patriarca sofre incontestável descrédito.
Quantas desgraças não devemos nós esperar, se entre os
sacerdotes se suscitarem tais ambições? Esse — bispo — será
o rei dos orgulhosos! (Pelágio II, Cet. 13). Com tais autoridades
e muitas outras que poderia citar-vos, julgo ter provado que os
primeiros bispos de Roma não foram reconhecidos como —
bispos universais ou papas — nos primeiros séculos do
Cristianismo. E, para reforçar ainda mais meus argumentos,
lembrarei aos meus veneráveis irmãos que foi Ósio, bispo de
Córdoba, quem presidiu o primeiro Concilio de Nicéia, redigindo
seus cânones; e que foi ainda esse bispo que, presidindo o
Concilio de Sárdica, excluiu o enviado de Júlio, bispo de Roma!
Mas, da direita me citam estas palavras de Cristo: Tu és Pedro
e sobre esta pedra edificarei minha Igreja. Sois, portanto,
chamado para este terreno.”
592
“Julgais, veneráveis irmãos, que a rocha ou a pedra
sobre a qual a Santa Igreja está edificada, é Pedro; mas,
permite que eu discorde desse vosso modo de pensar”.
“Diz São Cirilo no seu quarto livro a respeito da
Trindade: A rocha ou a pedra de que nos fala Mateus é a fé
imutável dos apóstolos. São Gregório, bispo de Poitiers, em
seu segundo livro a respeito da Trindade, repete que aquela
pedra é a rocha da fé, confessada pela boca de São Pedro. E,
no seu sexto livro, mais luz nos fornece dizendo: É sobre essa
exata rocha da confissão da fé que a Igreja está edificada. São
Jerônimo, no seu sexto livro a respeito de São Mateus, é de
opinião que Deus fundou sua Igreja sobre a rocha ou pedra
que deu seu nome a Pedro. Nas mesmas águas navega São
Crisóstomo quando em sua homília 56, a respeito de Mateus,
escreve: Sobre esta rocha edificarei minha Igreja; e esta rocha
é a confissão de Pedro”.
“Já que não me respondeis, eu vô-la darei: 'Tu és o
Cristo, o filho de Deus'. Ambrósio, o Santo arcebispo de Milão,
São Basílio, de Salência, e os padres do Concilio de
Calcedônia ensinam precisamente a mesma coisa. Entre os
doutores da Antigüidade cristã, Santo Agostinho ocupa um dos
primeiros lugares pela sua sabedoria e pela sua santidade.
Escutai como ele se expressa acerca da primeira epístola de
São João: 'Edificai minha Igreja sobre esta rocha, significa
claramente que é sobre a fé de Pedro'.”
593
“No seu tratado 124 acerca do mesmo João,
encontra-se esta significativa frase: 'Sobre esta rocha ou pedra
que me confessaste, que reconheceste, dizendo: Ta és o
Cristo, o filho de Deus vivo, edificarei minha Igreja, sobre mim
mesmo; pois sou o filho de Deus vivo. Edificarei sobre mim
mesmo e não sobre ti'.”
“Haverá coisa mais clara e positiva?”
“Deveis saber que esta compreensão de Santo
Agostinho, a respeito de tão importante ponto do Evangelho,
era a opinião corrente no mundo cristão naqueles tempos.
Estou certo de que não me contestareis. Assim é que,
resumindo, vos direi:”
“1 — Que Jesus deu aos outros apóstolos o mesmo
poder que deu a Pedro.”
“2 — Que os apóstolos nunca reconheceram em São
Pedro a qualidade de vigário de Cristo e infalível doutor da
Igreja.”
“3 — Que o mesmo Pedro nunca pensou ser papa
nem fez coisa alguma como papa.”
“4 — Que os Concílios dos primeiros quatro séculos
nunca deram, nem reconheceram, o poder e a jurisdição que
os bispos de Roma queriam ter.”
“5 — Que os Santos Padres, na famosa passagem
'Tu és Pedro e sobre esta pedra (a confissão de Pedro)
edificarei minha Igreja' nunca entenderam que a igreja não
594
estava edificada sobre Pedro (super Petrum) e sim sobre a
rocha (super Petram), isto é, sobre a confissão da fé do
apóstolo! Concluo, pois, com a história, a razão, a lógica, o
bom senso e a consciência do verdadeiro cristão, que Jesus
não deu supremacia alguma a Pedro e que os bispos de Roma
só se constituíram soberanos da Igreja confiscando, um por
um, todos os direitos do episcopado! (Vozes de todos os lados:
Silêncio, insolente! Silêncio! Silêncio!) Não sou insolente. Não,
mil vezes, não!”
“Contestai a história se ousais fazê-lo; mas, ficai
certos de que não a destruireis! Se avancei alguma inverdade,
ensinai-me isso com a história, à qual prometo fazer a mais
honrosa apologia. Mas, compreendei que não disse ainda tudo
quanto quero e posso dizer. Ainda que a fogueira me
aguardasse lá fora, eu não me calaria!”
“Sede pacientes como manda Jesus. Não jogueis a
cólera ao orgulho que vos domina.”
“Disse Monsenhor Dupanloup, nas suas célebres
Observações acerca deste Concilio do Vaticano, e com razão,
que, se declararmos infalível a Pio IX, necessariamente
precisamos sustentar que infalíveis também eram seus
antecessores. Porém, veneráveis irmãos, com a história na
mão, vos provarei que alguns papas faliram.”
595
“Passo a provar-lhes, meus veneráveis irmãos, com
os próprios livros existentes na biblioteca deste Vaticano, como
é que faliram alguns dos papas que vos têm governando:”
“O papa Marcelino entrou no templo de Vesta e
ofereceu incenso à deusa do Paganismo. Foi, portanto,
idolatra; ou pior ainda, foi apóstata! Libório consentiu na
condenação de Atanásio; depois passou-se para o Arianismo.”
“Honório aderiu ao Monoteísmo.”
“Gregório I chamava Anti-Cristo ao que se impunha
como Bispo universal e, entretanto, Bonifácio III conseguiu do
patriarca imperador Phoca obter esse título em 607.”
“Pasqual II e Eugênio II autorizavam os duelos
condenados pelo Cristo; enquanto Júlio II e Pio IV os proibira.
Adriano II, em 812, declarou válido o casamento civil;
entretanto, Pio VII, em 1823, o condenou. Xisto V publicou em
uma edição da Bíblia e, com uma Bula, recomendou sua
leitura; e aquele Pio VII excomungou a edição.”
“Clemente XIV aboliu a Companhia de Jesus
permitida por Paulo III; e o mesmo Pio VII a restabeleceu.”
“Porém, para que mais provas? Pois nosso Santo
Padre Pio IX não acaba de fazer a mesma coisa quando, na
sua Bula para os trabalhos deste Concilio, dá como revogado
tudo quanto se tenha feito em contrário ao que aqui for
determinado, ainda mesmo tratando-se de decisões dos seus
antecessores? Até isso negareis?”
596
“Nunca eu acabaria, meus veneráveis irmãos, se me
propusesse apresentar-vos todas as contradições dos papas,
em seus ensinamentos. Como, então, se poderá dar-lhes a
infalibilidade? Não sabeis que, fazendo infalível Sua Santidade,
que presente se acha e me ouve, tereis de negar sua
falibilidade e a dos seus antecessores?”
“E vos atrevereis a sustentar que o Espírito Santo
vos revelou que a infalibilidade dos papas data deste ano de
1870?”
“Não vos enganeis a vós mesmos. Se decretais o
dogma da infalibilidade papal vereis os protestantes, vossos
rancorosos adversários, penetrarem por larga brecha com a
bravura que lhe dá a História.”
“E que tereis vós a opor-lhes? O silêncio, se não
quiserdes desmoralizar-vos (gritos: É demais! Basta! Basta!).”
“Não griteis, Monsenhores! Temer a História é
confessar-vos derrotados! Ainda que pudésseis fazer correr
toda a água do Tibre sobre ela, não borrarei nenhuma só das
suas páginas! Deixai-me falar e serei breve. Virgílio comprou o
papado de Belisário, tenente do imperador Justiniano. Por isso,
foi condenado no segundo Concilio de Calcedônia, que
estabeleceu esse cânone: o bispo que se elevar por dinheiro
será degradado. Sem respeito àquele cânone, Eugênio II, seis
séculos depois, fez o mesmo que Virgílio e foi repreendido por
São Bernardo, que era a estrela brilhante do seu tempo.”
597
“Deveis conhecer a história do papa Formose;
Estêvão XI fez exumar seu corpo com as vestes pontificais;
mandou cortar-lhe os dedos e o arrojou ao Tibre. Estêvão foi
envenenado; e, tanto Romano como João, seus sucessores,
reabilitaram a memória de Formose.”
“Lede Plotino, lede Barônio, Barônio o Cardeal! É
dele que me sirvo. Barônio chega a dizer que as poderosas
cortesãs vendiam, trocavam e até se apoderavam dos
bispados; e, horrível é dizê-lo, faziam seus amantes serem
papas!”
“Genebrardo sustenta que, durante 150 anos, os
papas em vez de apóstolos foram apóstatas.”
“Deveis saber que o papa João XII foi eleito com a
idade de 18 anos tão-somente; e que seu antecessor era filho
do papa Sérgio com Marozia (a prostituta).”
“Que Alexandre XI era... nem me atrevo a dizer o
que ele era de Lucrécio; e que João XXII negou a imortalidade
da alma, sendo deposto pelo Concilio de Constança.”
“Já nem falo dos cismas que tanto têm desonrado a
Igreja. Volto, porém, a lhes dizer que, se decretais a
infalibilidade do atual bispo de Roma, devereis decretar
também a de todos os seus antecessores, mas vos atrevereis a
tanto? Sereis capazes de igualar a Deus todos os incestuosos,
avaros, homicidas e simoníacos bispos de Roma? (Gritos:
Descei da cadeira! Descei já! Tapemos a boca desse herege!)”
598
“Não griteis, meus veneráveis irmãos. Com gritos
nunca me convencereis. A História protestará eternamente
sobre o monstruoso dogma da infalibilidade papal; e, quando
mesmo todos vós o aproveis, faltará um voto e esse voto é o
meu!”
“Mas, voltemos à doutrina dos Apóstolos.”
“Fora dela só há erros, trevas e falsas tradições.
Tomemos a eles e aos profetas pelos nossos únicos mestres,
sob a chefia de Jesus. Firmes e imóveis como a rocha,
constantes e incorruptíveis nas inspiradas Escrituras, digamos
ao mundo: Assim como os sábios da Grécia foram vencidos por
Paulo, assim também a Igreja Romana será vencida pelo seu
98! (Gritos clamorosos: Abaixo o traidor da Igreja!) Vossos
gritos, Monsenhores, não me atemorizam e só vos
comprometem. Minhas palavras têm calor, mas minha cabeça
está serena. Não sou de Lutero, nem de Calvino, nem de Paulo
e sim e tão-somente do Cristo. (Novos gritos: Anátema,
anátema vos lançamos!”)
“Anátema! Anátema! para os que contrariam a
doutrina de Jesus! Ficai certos de que os apóstolos, se aqui
comparecessem, vos diriam a mesma coisa que acabo de lhes
declarar.”
“Que lhe direis vós, se eles, que predicaram e
confirmaram com seu sangue lembrando-vos o que
escreveram, vos mostrassem o quanto tendes deturpado o
599
Evangelho do amado filho de Deus? Acaso lhes diria:
Preferimos a doutrina dos Loyolas à do divino Mestre?”
“Não, mil vezes não! A não ser que tenhais tapado
os ouvidos, fechado os olhos e embotado vossas inteligências,
o que não creio. Oh! Se Deus quer castigar-nos, fazendo cair
pesadamente sua mão sobre nós, como fez ao Faraó, não
precisa permitir que os soldados de Garibaldi nos expulsem
daqui; basta deixar que façais de Pio IX um Deus, como já
fizestes uma deusa da Virgem Maria!
“Evitai, sim, evitai, meus veneráveis irmãos, o terrível
princípio cuja borda estais colocados. Salvai a Igreja do
naufrágio que a ameaça e busquemos todos, nas Sagradas
Escrituras, a regra da fé que devemos crer e professar. Dignese
Deus a assistir-me. Tenho concluído".
Todos os bispos se levantaram, muitos saíram da sala, porém alguns
prelados italianos, americanos, alemães, franceses e ingleses rodearam o inspirado
orador, e, com fraternais apertos de mão, demonstraram concordar com seu modo
de pensar.
Será possível que haja um homem de espírito elevado, ou, mesmo, de
medíocre inteligência, após ter ouvido semelhante discurso, que não sinta sua fé
católica profundamente abalada?
Não foram palavras ditas em praça pública por algum padre reacionário
ou escritas em jornal acatólico; mas foi o próprio Verbo de Jesus que chicoteou
aquelas almas negras, pela boca de um dos seus mais eminentes membros, dentro
600
do recinto mais sagrado e onde reside, segundo eles, a terceira pessoa da divindade
— o Espírito Santo.
Não há defesa possível para reabilitar uma instituição cujos princípios e
fins aberram da doutrina daquele a quem pretendem apresentar como fundador.
Se não fosse a obrigatoriedade, sob terríveis ameaças de penas eternas
e excomunhões de todo o católico crer sem discutir ou resmungar, evidentemente
raros seriam aqueles que dessem crédito à criação, ex-nihilo, ao pecado de Adão e
Eva, ao nascimento virginal de Jesus, à sua encarnação divina, à Redenção, à
Ressurreição da Carne, ao Inferno eterno e a essa impagável infalibilidade.
As pretensões que ela afirma movem-se em um círculo vicioso. Por um
lado baseia essa autoridade infalível sobre os textos escritos e por outro lado ela
proclama sua própria inspiração para interpretar esses mesmos textos. É a
incoerência no seu maior grau.
Se houvesse um Papa corajoso, verdadeiramente cristão, que, em vez de
dizer "Non possumus", dissesse: "Scimus, Sumus, possumus, volumus", e abrogasse
esta infalibilidade e certos dogmas prejudiciais à religião, facílimo seria a
reconciliação de todas as ovelhas afugentadas.
Essa coragem quase a teve o Papa Leão XIII quando pretendeu reformar
certos dogmas do Catolicismo, de acordo com os progressos da Ciência; a cúria,
porém, se opôs, dirigida, como é, pelos Jesuítas.
O papa Pio IX disse depois que o Pontífice pode e deve reconciliar-se e
pôr-se em harmonia com o progresso, o liberalismo e a civilização moderna; mas o
Sílabo proibiu-lhe esse gesto inteligente e nobre.
Por que não tem essa coragem o Papa Pio XI? Fácil lhe seria isso, agora,
após a reconciliação do Quirinal.
601
É porque ali reside o anti-Cristo em vez do Cristo; o Tigre em vez do
Cordeiro; o Nimrod em vez de Rama; o Espírito do Mal em vez do Espírito Santo.
O Anti-Cristo
Já São Boaventura, Cardeal e Geral da sua Ordem, comentando o
Apocalipse de João, indigitava Roma como a prostituta que embriagava príncipes e
povos, com o vinho de sua crapulice, e dizia que em Roma se compravam e se
vendiam cargos da Igreja. Os pontífices e príncipes da Igreja, desprezando Deus, se
engolfaram em devassidão, aderindo a Satanás, saqueando o tesouro de Cristo. Ele
descreveu o acervo de imoralidades, de avareza, ce preguiça, de vícios e corrupção
de todo gênero, sendo os cristãos envenenados pelo clero, com veneno propinado
pelos prelados.
Ora, se isso foi dito pelo Geral de uma Ordem, cumulada de honradas
pelo papa, o que não se deveria esperar dos espirituais que retratavam a Igreja
Romana como a igreja da carne e da corrupção347?
Não é, pois, de admirar que o papa João XXII mandasse queimar os 114
espirituais que faziam parte dessa Ordem.
Que o Papa seja o anti-Cristo, que Roma seja a Babilônia condenada no
Apocalipse de João, basta que passemos a pena ao erudito engenheiro Ernesto Luiz
de Oliveira348, cujos argumentos comprobatórios são fornecidos involuntariamente
pelo padre Jesuíta brasileiro Leonel Franca349. Diz ele:
347 Rui Barbosa — Passim.
348 Roma, a Igreja e o Anti-Cristo.
349 A Igreja, a Reforma e a Civilização.
602
"...a Sagrada Escritura fala de um outro Vigário ou
substituto de Jesus Cristo que não o divino Espírito Santo, a
saber: o Anti-Cristo. Com efeito, a palavra Vigário, da latina
vicarius, significa o que ocupa o lugar de um outro, o substituto
deste outro. Por sua vez, a palavra Anti-Cristo se compõe da
preposição anti e da palavra cristo. Mas anti, como se pode ver
em Hichie (Greck lnglish, lexiori), significa em vez de, em lugar
de. Assim, anti-Cristo, significa aquele que está em lugar de
Cristo. Daí resulta que anti-Cristo significa precisamente Vigário
de Cristo, nome com que se apelidam os bispos de Roma. E
quando a Sagrada Escritura nos declara que esse tal havia de
manifestar-se na Babilônia, a Grande, e o Revmo. Franca nos
demonstra que no Novo Testamento, por Babilônia, deve-se
entender Roma, a lógica nos declara que ali deve tresandar a
enxofre".
Já o Papa Gregório I disse em sua Epístola Lib. VII:
"Na verdade, digo, confiadamente, que qualquer que
a si mesmo se intitula Sacerdote Universal ou deseja ser assim
chamado em seu orgulho procede como Anti-Cristo, porque
com soberba se antepõe aos demais".
603
Dante, o glorioso poeta, considerava as "Decretais350" como uma origem
de corrupção e reconhecia no Papado a realização do anunciado no Apocalipse,
considerando Roma como a prostituta das sete colinas que, inebriada de sangue
humano, turvava a razão a príncipes e povos.
Dante via no Papa a potência que debilitava o império, o abalava e o
precipitava na ruína, reconhecendo no Pontífice o precursor do Anti-Cristo que
vinha anunciar a volta de Satanás.
Petrarca era da mesma opinião.
Não era de admirar que Dante e outros assim se exprimissem, quando os
próprios funcionários da Corte Papal o proclamavam à boca cheia e o próprio bispo
Pelágio assim se exprimia: "Nada de mais natural que tacharem os hereges a Igreja
inteira de prostituta, atento à geral simonia que da Cúria papal se entorna por toda
a Igreja e a corrupção religiosa que dali provém. No Vaticano a ambição andou
sempre ao lado da baixeza".
Luigi Marcigli, religioso da Ordem dos Agostinianos, dizia que "os papas e
a Cúria eram dissolutos, avarentos e que o papa já não dominava a Igreja pela
hipocrisia, mas estadeava até seus crimes aos olhos de todos, regendo o povo pelo
terror dos seus anátemas e de suas maldições".
Peçamos ainda a Pierre Rousselet e Joseph Huby, em sua citada obra
apologética "Christus" as suas abalizadas opiniões.
"Os Cátaros, diziam eles, adotavam a teoria
gnóstica dos íons."
350 Infame falsificação de Decretos, sobre os quais a Igreja se guiou por muitos séculos até ser
descoberta sua falsidade.
604
Jesus não passava de um desses inumeráveis espíritos emanados da
substância divina. A encarnação e a redenção eram explicadas no sentido dos
docetas. Graças, sacramentos, culto da cruz e dos santos, imagens, relíquias, missa
eram rejeitados e substituídos pelo Consolamentum, espécie de batismo pelo
Espírito, com imposição do Novo Testamento, sobre a cabeça do candidato.
A moral dos Perfeitos era austera em excesso: abstinência absoluta de
qualquer alimento animal, excetuando o peixe, virgindade perpétua, horror à mentira,
fidelidade inviolável à seita, interdição ao casamento e à generação, visto ser a
matéria essencialmente má, proibição de juramento. Seguiam a regra dos apóstolos,
seu superior era o primaz da virtude. Repudiavam, por completo, a liturgia católica,
visto Cristo só ter ensinado uma única oração. Eram antimilitaristas; condenavam a
guerra e negavam ao Poder civil o direito do gládio, de acordo com a frase de Jesus:
"Quem com ferro fere" etc. E, como a Igreja Romana não correspondia a seu ideal, a
repudiaram como sendo a sinagoga de Satanás.
Tais eram os Cátaros que causavam admiração e veneração aos próprios
católicos.
Para as primeiras comunidades cristãs, só o Cristo existia; elas
conservavam o antigo princípio da iniciação hierarquizada e graduada e a
chamavam de Gnose. A união com o Cristo era para elas um fenômeno místico,
superior a qualquer outro, uma realidade, ao mesmo tempo individual e coletiva.
Mas, desde que Santo Agostinho forjou o dogma dizendo que a Fé na Igreja
estabelecida substitui tudo mais, o princípio da iniciação foi suprimido e a fé cega
ocupou seu lugar. A submissão à Igreja e aos seus decretos substituiu o Cristo vivo.
Enquanto os santos e os mártires convertiam os povos do Norte pelo seu sangue e
sua sublime exaltação, a Igreja, cada vez mais Romanizada, se encolheu no seu
605
dogma e não mais pensou senão em dominação temporal e em escravização das
almas, pela mutilação do espírito.
Não mais se precisa de Jesus Cristo, disse ela, pois temos o Papa. Que
as trevas reinem na consciência contanto que o arcabouço da Igreja subsista!
Que são essas pouquíssimas citações que acabamos de fazer ante os
volumosos livros arquivados no Vaticano e nas Bibliotecas públicas a respeito da
matéria? Certamente, uma gota d'água no Oceano; mas essa gota é suficiente para
mover o dínamo da inteligência, produzindo a luz necessária à dissipação das trevas
em que jaz o espírito, vendado por mãos criminosas de homens sem pátria, sem
família, sem compromissos perante a sociedade civil.
É impossível que um católico, por mais fanatizado que esteja, não sinta
sua consciência de cristão abalada ante tantas provas fornecidas pela própria
história da sua seita e não procure, no próprio interesse, para a salvação da sua
alma, pesquisar essas verdades, a fim de desmenti-las ou aceitá-las, voltando então
as costas ao embusteiro que vive à custa da sua credulidade.
Celibato do Padre
Não há História, seja de qualquer dinastia asiática ou européia, por mais
devassa que tenha sido, do que a História dos Papas, que ocuparam a famosa
cadeira de Pedro.
Mais adiante, numa resenha que faremos, salientaremos somente
algumas dúzias de verdadeiros Paxás da Turquia, que fizeram do Vaticano o maior
harém conhecido e onde os crimes de defloramentos, de incestos, de pederastia não
encontram paridade com os praticados nos maiores lupanares da Roma antiga.
606
Há mesmo no Vaticano, junto aos aposentos particulares do Papa, uma
escadaria subterrânea para acesso de pessoas mais íntimas, que não passam pelas
portas protocolares.
Não há quem não conheça a história de Lucrécia Bórgia e da Papisa
Joana, que deu à luz em plena procissão. O escândalo foi de tal ordem que a
Congregação dos Ritos teve de criar a Cadeira furada, na qual teriam de se sentar
futuros papas, para o reconhecimento, em pleno cerimonial da sua máscula
personalidade. Dizem mesmo, mas não garantimos, que eram pronunciadas as
seguintes palavras, acompanhadas por órgãos e cantochão: "Em quan... ti... da...
de... Amém!".
Onze séculos após a morte do pobre Cristo, o escândalo público era de
tal ordem, não só internamente, como entre o clero civil, que o papa Hildebrando foi
forçado a decretar o Celibato do padre.
Após uma série de peripécias, a Igreja, ora permitindo aos que fossem
casados residirem com suas esposas e filhos, de acordo com a recomendação de
São Paulo, era proibida a convivência sob o mesmo teto, ora permitindo a
concubinagem aos celibatários, ora proibindo, ora substituindo-a pela convivência
com dois noviços, ora com um só, ora anulando esse pernicioso costume, nos dá
uma idéia do espírito de dissolução que sempre reinou no Vaticano.
O voto de celibato, na opinião de Estanislau Orichorius, cônego na
Catedral de Premislaw, citado por M. Gregóire, bispo de Blois, em sua obra Histoire
des mariages des prêtres (1826), é idêntico ao voto que ele tivesse feito de tocar o
céu com o dedo, pois tal voto não o obriga a coisa alguma.
Valham-nos, ao menos, os Jainas, da Índia, de cuja seita só fazem parte
os que triunfam da sensualidade.
607
Pio II escreveu que, "por invencíveis razões, interditou-se o casamento
dos padres; porém, por mais invencíveis razões, era preciso permiti-lo".
Entretanto, ainda em 1859, era hábito no Vaticano castrarem-se jovens
seminaristas, ainda não tonsurados para servir nos coros da igreja de São Pedro, a
fim de cantar os hinos da dor e da compunção, por ocasião da Semana Santa.
Quem nos poderá garantir que tal costume não continue em vigor, dado o
conservadorismo dos regulamentos?
É possível que se tal medida, copiada dos haréns da Turquia, onde se
castravam os eunucos, não fosse revogada e prevalecesse como uma das
condições da ordenação, o clero católico seria hoje bem reduzido, mas composto de
homens comprovadamente inofensivos à moral pública e, quiçá, verdadeiros
cristãos.
Isso corroboraria a frase de Bermond Choveronius, cônego de Viviers, em
seu livro De publicis concubinariis, página 8: "O mugir dos bois ou o grunhir dos
porcos são mais agradáveis a Deus que os cânticos dos padres fornicadores".
Quando o clero for casado, o confessionário só se prestará para guarita
de soldados.
Não há religião ou Culto no mundo que use de tal processo para santificar
seu clero. Essa formalidade só tem trazido formidáveis escândalos.
Sem recorrermos a milhares de casos, extrairemos um dos processos
arquivados na Torre do Tombo, em Lisboa, armário 5°, maço 7°, datado do ano
1478, referente à sentença lavrada contra o padre Fernandes Costa, que extraímos
do jornal A Fraternidade da cidade de Coimbra.
Diz este documento:
608
"Padre Fernandes Costa, prior que foi de Trancoso,
da idade de 62 anos, será degradado de suas ordens e
arrastado pelas ruas públicas ao rabo de cavalos, esquartejado
o seu corpo e posto em quartos e a cabeça e mãos em
diferentes distritos, pelo crime de que foi argüido, que ele
mesmo não contrariou, sendo acusado de ter dormido com 29
afilhadas, tendo delas 97 filhas e 37 filhos; de cinco irmãs teve
18 filhos e filhas; de nove comadres teve 38 filhas e 18 filhos;
de nove amas teve 29 filhas e cinco filhos; de duas escravas
teve 21 filhas e sete filhos; dormiu com uma tia chamada Anna
da Costa de quem teve três filhos e ... da própria mãe teve dois
filhos!!! Total 275 filhos sendo 200 do sexo feminino e 75 do
masculino, sendo concebidos de 54 mulheres!
“O rei João II perdoou ao fecundo sotaina e o
mandou pôr em liberdade em 17 de março de 1487 e guardar
no Real Arquivo da Torre do Tombo esta sentença e mais
papéis que formam o processo!"
É impossível que o leitor não tenha corado e sentido seus nervos irritados,
íamos continuar com uma lista de escandalosos fatos, ocorridos no nosso país, de
autoria de padres inescrupulosos, alguns já falecidos e outros vivos, que não
cessavam de pregar a moral; mas que se tranqüilizem; o arrependimento ainda
poderá ser útil às suas almas.
As escabrosas questões a respeito de mulheres improdutivas nunca
foram abordadas por nenhuma religião do mundo e ainda menos pelo Rabino da
609
Galiléia que se limitou a dizer à mulher adúltera: "Vai e não peques mais". Isto é, não
engane mais seu marido.
Mais adiante, porém, voltaremos ao assunto quando tratarmos de Moral
Jesuítica.
Contudo, antes de fecharmos este artigo, vamos citar um dos milhares de
pequenos casos que se repetem na nossa pátria, mas que a imprensa trata ce
embaralhar, ou por ignorância, ou por malícia, para encobrir o nome do segundo
delinqüente, visto como, em ambas as notícias, trata-se do padre Victor Coelho de
Almeida, ora chamado na notícia do A Noite, de dezembro de 192r — Padre Victor
Coelho, ora chamado na de O Globo, de 11 de agosto de 1932 (dois anos e meses
depois) de Victor de Almeida, ora Victor Coelho; não podendo, porém, ser o mesmo,
pois o do A Noite "teve 15 filhos, goza a vida e sem mais explicações, abandona
mulher e filhos e recolhe-se ao claustro", a: passo que o de O Globo, três anos
depois, "abandona a mulher com uma filha de 15 anos, recolhe-se ao convento,
produzindo o suicídio de sua infeliz esposa"!
Disse Jesus que não há pior cego do que aquele que não quer ver. Pior.
porém, é aquele que procura tapar o sol com uma peneira para que os outros não
possam vê-lo.
É lógico que os que se comprazem nessa prostituição rebatam os
honestos colegas que romperam com esse foco de miasmas, dizendo às suas
incautas ovelhas: Não os ledes, não os acrediteis, são filhos do diabo, que não
puderam resistir à cruz do Cristo e fugiram para o inferno; mas não dizem que
aqueles se afastaram envergonhados desse centro de prostituição, ao passo que
eles permanecem, hipocritamente, usufruindo os gozos da vida.
610
E bom chamarmos a atenção desde já do leitor para nossa abstenção em
tocar no dogma da "Confissão". São tais os horrores, são tais as infâmias e os
crimes cometidos e relatados em centenas de obras, não por hereges, mas por
inúmeros padres que, muitos, enojados e apavorados desse antro de perdição de
moças virgens e senhoras casadas ou viúvas, despiram as vestes sacerdotais e
deram o grito de alarme.
Contudo, vejamos o que diz a tal respeito um dos Sumos Pontífices da
Igreja:
Chiniqui, à página 44, relata que o Papa Pio IV, em 1560, ordenou que
todas as mulheres solteiras e casadas que tivessem sido seduzidas pelos seus
confessores fossem denunciá-los.
Principiou-se por Sevilha. Tornado conhecido o Edito do Papa, o número
de mulheres foi tão considerável que, apesar de haver três escrivãs, não puderam
concluir o trabalho no prazo determinado. Mais 60 dias foram concedidos; mas
tiveram de reconhecer que o número de padres sedutores era tanto que se tornaria
impossível castigá-los e a coisa ficou nisso!
Como não ser assim se o padre é forçado a perguntar às penitentes,
cautae et poucae!
Estupenda moral! E são esses que pregam contra o divórcio e o
casamento civil por desorganizador da família!
Jesuitismo e sua Moral
Não pretendemos neste estudo descrever a História do Jesuitismo. Não
faltam obras a respeito, escritas por mestres e historiadores. Contudo, como
acabamos de nos referir à moral do Catolicismo, justo é que também façamos uma
611
pequena comparação da moral da Companhia de Jesus com a moral que o mesmo
Jesus pregou, pois essa congregação, como o indica seu nome, deve estar firmada
sobre os preceitos e a doutrina do Mestre, que tomaram como modelo e como
símbolo.
Foi em 1534 que sete estudantes galgaram Montmartre, em Paris,
chefiados pelo espanhol Inácio de Loyola. Entraram no convento das religiosas,
chegaram na capela, ajoelharam-se e, perante o altar da Virgem, formularam os três
seguintes votos: Contentarem-se com o necessário, converterem os descrentes,
fazerem peregrinação a Jerusalém, e, no caso de impossibilidade, oferecerem seus
serviços ao Papa, ao ponto de tornar-se, mais tarde, a "Companhia de Jesus" sua
Guarda Pretoriana.
Quando se fala em "Companhia de Jesus" o letrado ou analfabeto (o que
é curioso) não deixa de se arrepiar ante a lembrança dos horrores cometidos pelo
Santo Ofício da Inquisição, saído da satânica cabeça do frade Dominico, após as
Cruzadas contra os albigenses, em que foram lançados às fogueiras e às mais
cruéis torturas, dignas de cérebros infernais, milhares de almas indefesas, cujo crime
consistia em não cultuar do mesmo modo o mesmo Deus dos seus algozes e ao
próprio clero que ousasse divergir ou interpretar de outra maneira o que havia sido
decretado pelo Papa e tudo friamente em nome de Deus.
A tortura da Inquisição, a pena de morte e o fogo foram autorizados pelo
Papa Inocêncio IV.
Dupuis é de opinião que "se houver alguém que possa, sem tremer,
encarar a tirania daquela Companhia e contemplar sem horror todos os destroços e
todas as hecatombes que cometeu, merece também ser vítima".
612
Quem alimenta essa hidra e a defende é o maior inimigo da humanidade,
porque a história inflexível aí está para condená-la.
Para sintetizar em poucas palavras a moral dessa instituição que ainda
existe, apesar da sua dissolução, e existirá enquanto não consumirem a pobre
humanidade ou esta não aniquilar definitivamente esta sucursal do inferno, cujo
palácio funciona na rua do mesmo nome, dentro dos domínios do Vaticano, vamos
extrair uma página de Voltaire, do seu Traité de Tolerance:
Carta escrita ao jesuíta Le Tellier por um beneficiário, em 6 de maio de
1774, mas cuja data pode ser transferida para a atual, porque a essência não varia.
"Meu reverendo pai,
“Obedeço às ordens que Vossa Reverência me deu
de lhe apresentar os meios próprios de livrar Jesus e sua
Companhia dos seus inimigos. Creio que não restam mais do
que 500 mil huguenotes no reino; alguns dizem um milhão,
outros um milhão e meio, mas, seja como for, eis minha opinião
que eu submeto muito humildemente à vossa, como é de meu
dever.”
1º — É fácil segurar em um só dia todos os
pregadores e enforcá-los ao mesmo tempo, numa mesma
praça, não só para edificação pública, mas para a beleza do
espetáculo.
2° — Eu farei assassinar em suas camas todos os
pais e mães, porque se os matassem nas ruas, isso poderia
causar tumultos; alguns mesmo podiam escapar-se o que é
613
preciso evitar. Essa execução é um corolário, necessário dos
nossos princípios; pois se é mister matar um herético, como
tantos teólogos o provam, é evidente que se deve matá-los a
todos.
3º — No dia seguinte eu casarei as raparigas com
bons católicos, visto como não devemos despovoar o país,
máxime depois da guerra; mas, com respeito aos rapazes de
14 ou 15 anos já embebidos de maus princípios, que não nos
podemos gabar de destruir, minha opinião é que devemos
castrá-los todos, a fim de que essa raça não se reproduza.
Para as criancinhas, elas serão educadas em vossos colégios
e as sovaremos até que saibam de cor as obras de Sanchez e
Molina.
4º — Penso, salvo correção, que se deve fazer o
mesmo a todos os luteranos da Alsácia, visto como no ano
1764 eu vi duas velhas desse país rirem-se no dia da batalha
de Heschstel.
5º — O artigo dos Jansenistas talvez pareça um
pouco embaraçoso; creio que eles são em número de seis
milhões, no mínimo; mas, um espírito como o vosso não se
deve atemorizar. Incluo entre os Jansenistas todos os
Parlamentos que sustentam tão indignamente as liberdades da
Igreja galicana.
Compete a V. Rev. pesar, com sua prudência
ordinária, os meios para submeter esses espíritos rebeldes. A
614
conspiração das polvorosas não teve o desejado sucesso,
porque um dos conjurados teve a indiscrição de querer salvar a
vida de um amigo, mas, como V. Rev. não tem amigos, o
mesmo inconveniente não é para recear; ser-vos-á fácil fazer
saltar todos os Parlamentos do Reino com esta invenção do
frade Schwarz351 que se chama pulvio pyrius. Calculo que seja
preciso relativamente 36 toneladas de pólvora para cada
Parlamento e, assim multiplicando 12 parlamentos por 36
toneladas, isso dá 432 toneladas, que, a cem escudos,
importam em 129 mil libras, é uma bagatela para o reverendo
Pai Geral. Os Parlamentos uma vez voados pelos ares, dareis
os cargos aos vossos congregacionalistas, que estão
perfeitamente instruídos das causas do reino.
6º — Será fácil envenenar o Cardeal de Noailles que
é um homem simples e não desconfiaria de nada.
V. Rev. empregará os mesmos meios de conversão
junto a alguns bispos renitentes; seus bispados ficarão
pertencendo aos Jesuítas, mediante um decreto do papa;
então todos os bispos estando do lado da boa causa e todos os
curas, habilmente escolhidos pelos bispos, eis o que
aconselho, caso agrade a V. Ex.
7º — Como se diz que os Jansenistas comungam na
Páscoa, não seria mau polvilhar as hóstias com a droga que
serviu para justiçar Henrique VII Algum crítico dir-me-á, talvez,
351 Provado está hoje ser isso falso, pois a pólvora já era conhecida na China e nas Índias.
615
que arriscar-se-ia nesta operação de dar-se também a morte
aos molinistas; essa objeção é forte; mas não há projeto que
não ameace ruína em algum ponto. Se formos encarar essas
pequenas dificuldades, nunca se fará coisa alguma, e, demais,
como se trata de proporcionar o maior bem possível, é preciso
não nos escandalizarmos se esse grande bem arrasta consigo
algumas conseqüências, mas que não merecem consideração.
Nada temos a nos repreender; está demonstrado que todos os
pretensos reformadores, todos os Jansenistas, estão
destinados ao inferno; assim, nada mais fazemos do que
abreviar o momento em que eles devem entrar de posse do
seu domínio.
Nada mais claro também que o paraíso pertence de
direito aos molinistas; logo, fazendo-os morrer, por descuido, e
sem nenhuma má intenção, aceleraremos seu prazer; em um
ou outro caso, somos os Ministros da Providência.
Quanto aos que se apavorarem do número, vossa
paternidade poderá chamar-lhes a atenção para que, desde os
dias florescentes da Igreja até 1707, isto é, cerca de 1.400
anos, a teologia conseguiu o massacre superior a 50 milhões
de homens e eu só proponho enforcar, degolar ou aprisionar
cerca de seis milhões e meio.
Talvez nos objetem que nosso cálculo não está certo
e que eu falseio a regra de três; pois dirão: se em 1.400 anos
só pereceram 50 milhões de homens por questões de dilemas
616
e antilemas, de teologias, isso só dá por ano 35.714 pessoas,
com fração e com minhas idéias, matam-se 6.064.268 pessoas
mais, com fração para o presente ano. Mas, na verdade, essa
chicana é pueril; pode-se mesmo dizer que ela é ímpia, pois
não se vê logo que pelo meu processo eu salvo a vida de todos
os católicos até o fim do mundo? Nunca se fará coisa alguma,
se quiserem atender a todas as críticas. Sou com profundo
respeito de vossa paternidade. O muito humilde, devotado e
muito dócil, R... nascido em Angoulème, prefeito da
Congregação".
Isso, quanto à parte militante.
Vejamos, agora, o Sistema de Moral desta Instituição baseado, como é,
sobre a isenção de crime ou pecado, uma vez que forem praticados contra pessoas
supostamente contrárias às suas idéias; pois matar, roubar, deflorar, violar mulheres
não constituem pecado, uma vez que seja para o bem da Igreja e... ad majorem Dei
gloriaml
Como uma das mais modestas provas do que fica dito e para que não nos
caluniem de fantasistas, vamos extrair uma página de Santo Inácio de Liguório,
cujos livros canônicos, por ocasião da sua beatificação, em 1803, foram
severamente examinados e aprovados de acordo com a disciplina da Santa Sé
Apostólica, por nada conterem digno de censura.
Diz mais O Concilio, que em Sistema de Moral foi mais de 20 vezes
rigorosamente discutido pela Sagrada Congregação, que o aceita unanimemente.
617
Eis algumas linhas. Que as aprecie o leitor e que sua consciência de
homem de bem diga se foi esta a moral que Jesus ensinou, se foi esta linguagem
que ele usou, se foi este o assunto que ele doutrinou.
"O Confessor não deve ser denunciado:”
“1º — Quando a mulher pede para se confessar, e,
no decurso da confissão, tentando ele, começa a instigar a
penitente.”
“2° — Quando o Confessor diz: 'Espere-me um
pouco, porque tenho de fazer coisa com grande urgência, e
depois a tenta.”
“3º — Quando o Confessor põe-se de acordo com a
mulher que, para enganar sua família, se finge de doente e vai
à casa dela para...”
“4º — Quando instigado a ter com ela relações
amorosas, recusa-se e apenas se diverte com toques ou
apalpações só venialmente desonestas (Livro VI, páginas 682
e 683)".
No mesmo Livro VI, na página 935, lê-se o seguinte, em latim que o leitor
pedirá ao vigário da sua freguesia para traduzir, tal a imundície que nossa pena se
envergonha de o fazer:
"Eodem autem modo Sonchez damnat virum de
mortali, qui in actu copulae immiteret digitum in vas
618
praeposterum uxoris, qui (ut ait) in hoc actu adest infectus
sodomiam.
Ego autem censeo posse quidem reperiri talem
affectum in actu, sedperse, loquendo hunc affectum non
agnosco in tali actum insitum. Caeterum graviter semper
increpandos dico coniuges huiusmodi foedum actum
exercentes".
Agora e para encaixar no ensino religioso:
"Atamen inchoare copulam in vase praepostero cum
intentione eam consumandi in vagina; velgenitalibus tangere
vas praeposterum, dummodo praecaveatur effusio seminis et
excludatur omnis affectus sodomiticus, non sunt probabiliter
peccata mortalia: qui prior actusfit tanquam praeparatio ad
copulam in vase debito, posterior autem estsolum tactus inter
cônjuges non prohibitus in gravi".
Com relação à moralidade da teologia romana citemos seus próprios
textos:
"Tam clarum videtur, fornicationem secundum se
nullam involvere malitiam et solum esse malum, quia interdicta,
ut contrario omnino rationi dissonum videatur.” (Cons. De
Lovanio).”
619
"Si quis delectetur de copula cum muliere nunta, non
quia nupta, sed quia pulcra, abstrahendo, scilicet, a
árcumstanáa matrimonii, justa plures auetores, hace delectatio
non habet malitiam adulteriri, sed simplicis fornicationis.
Sentencia hace probabilis vocatura bento Uguorio" (J. P.
Moullet — Compendium, tomo I, página 126).
Aí vai a tradução deste último trecho:
"Se alguém se deleita com a cópula com mulher
casada, não por ser casada, mas, por ser bela, abstraindo, é
claro, da circunstância do matrimônio, segundo vários autores,
esse deleite não tem pecado de adultério; mas, sim, de simples
fornicação" (Livro V, 15).
Acreditamos, piamente, que não haja um só dos nossos leitores que não
sinta sua alma estourar de indignação ante tal imoralidade, ensinada pelos santos
da Igreja, aprovada por Papas e confirmada por Concílios.
Mas, para tudo há remédio neste mundo sublunar...
Por isso vamos extrair algumas receitas da Farmacopéia do Vaticano,
mandadas imprimir em Roma pelo Papa Leão X, em 18 de novembro de 1514, e
cujo título é o seguinte:
"Taxas da Sagrada Chancelaria e da Sagrada
Penitência Apostólica".
620
As taxas e o valor monetário mudaram com o tempo para lira e centavos,
mas a essência continua a vigorar na Sagrada Casa de Deus.
Assim:
"A absolvição é dada:
A quem conhecer carnalmente sua mãe, sua irmã
etc. mediante o pagamento de cinco Gros”.
“A quem deflorar uma virgem — seis gros. A quem
revelar a confissão de um outro — sete gros. A quem matar
seu pai ou sua mãe — cinco gros.”
“O clérigo que cometer atos reprovados com
religiosas no claustro ou fora dele, com seus parentes e
aliados, com sua filha espiritual (afilhada) ou com outras
mulheres pagará três ducados.”
“O padre que tiver uma concubina, vinte e um
torneios, cinco ducados e seis carlinos.”
“A mulher que tiver tomado beberagem para abortar
ou o pai que lha tiver dado, pagará quatro torneios, um ducado
e oito carlinos, e, se for um estranho, pagará quatro torneios,
um ducado e seis carlinos. Um pai ou uma mãe que tiver
esganado um filho pagará quatro torneios, um ducado e oito
carlinos.”
“Para contrair casamento, na época própria, é de
vinte carlinos e nos tempos impróprios, se os contratantes são
do segundo ou terceiro grau, ordinariamente pagarão vinte e
621
cinco ducados e quatro para a expedição da bula; no quarto
grau será de sete torneios, um ducado e seis carlinos. A
absolvição de um apóstata e de um vagabundo que querem
regressar ao seio da igreja custa doze torneios, três ducados e
seis carlinos. A absolvição de um sacrílego, de um ladrão, de
um incendiário, de um perjuro custa trinta e seis torneios e
nove ducados.”
“A permissão para trocar de nome, de sobrenome
custa seis torneios e dois ducados".
E por aí afora...
Tudo em Roma, por dinheiro, já diziam os romanos.
Foi por essas torpezas que os frades Lutero, Calvino e muitos outros
santos da Igreja se revoltaram e constituíram igrejas de acordo com as sagradas
escrituras e com os ensinamentos de Jesus e nos nossos tempos o verdadeiro
Cristianismo se cinde do Catolicismo romano, criando seitas em que a imoralidade e
a simonia são implacavelmente condenadas e não tachadas.
A respeito do comércio das indulgências, ainda praticado no Vaticano,
citemos a resolução do Concilio de Trento352:
"Aqueles que compram cartas de indulgência podem
ficar certos da sua salvação; as almas que estão no purgatório,
pela redenção das quais se adquirem as indulgências, logo que
352 Chemnitz Examen Concilii Tridentini.
622
o dinheiro caia no cofre, escapam-se do lugar do tormento e
sobem ao céu.”
“A eficácia das indulgências é tão grande que elas
podem apagar os mais monstruosos crimes, inclusive o da
violação da própria Virgem Maria se tal fosse possível" (!!!!!).
Felizmente, Jesus, os apóstolos e a própria Virgem Maria não leram essa
bula porque estavam distraídos com os cânticos celestiais.
Não há no mundo religião ou culto por mais estrambólico que faça do seu
altar tão vergonhoso balcão.
A Igreja Romana vende o perdão que o próprio Jesus pagou com seu
sangue, vende a moral social e seus preceitos, vende os méritos do sangue dos
justos, vende o direito de infringir as regras da moral, vende a justiça de Deus, de
que ela proclama a eqüidade, vende o reino dos céus aos pedaços, por meio do qual
Jesus fechou a corrupção dos ricos e cujas chaves, em vez de abrir suas portas,
abrem as dos vícios vomitados pelo seu inferno, vende chapéus cardinalícios,
púrpuras, mitras e a própria tiara pontificai, vende relíquias de santos, coroas
imperiais e fachadas presidenciais, resgata almas do purgatório por pouco preço e
por muito dinheiro conseguiria tirar do inferno o maior celerado.
Entre Deus e o adepto está erguida a Igreja Católica que, por isso
mesmo, ofusca Deus ao crente.
"O papa especula com os Cardeais, estes com os
arcebispos, estes com os bispos, estes com os padres, estes
com os sacristãos e estes com a freguesia!"
623
Sinceramente! Haverá alguém de incorruptível moralidade que aceite
semelhantes códigos como base da moral de Jesus? Haverá homem de bem,
verdadeiramente religioso, que não sinta o desejo de empunhar o mesmo chicote
que se diz que Jesus empunhou e não corra esses mercadores do templo?
Não! Não é esta a moral que o meigo Jesus pregou. Não é esta sua
doutrina. Não; não é esta a moral búdica, bramânica, maometana, protestante,
cristã, espírita!
É a moral de Satanás! Do Princípio do Mal! É a moral do anti-Cristo. É a
moral do Catolicismo romano!
O Catolicismo da Idade Média que é o mesmo dos nossos tempos,
porque Roma representa a imobilidade, empregou o mesmo raciocínio usado pelos
bárbaros, cuja religião consistia em oferecer aos seus deuses o sangue dos seus
inimigos ou considerados como tais.
Com um povo fanatizado como o nosso, mantido em imperdoável
ignorância, não é de admirar que brevemente surja no Brasil um novo Torquemada,
facílimo de encontrar, em cada esquina, e se acendam de novo as fogueiras em
praça pública ou, pelo menos, se institua oficialmente uma sistemática perseguição
a quem não fizer parte da Camorra romana, auxiliada por uma imprensa, cujo
programa apologético não admite adversários.
Duvidam?
Pois bem, aí vai a transcrição do artigo publicado pelo Semeador de
Alagoas, no seu número de 15 de maio de 1931, dirigido pelos cônegos Augusto
Valente e João Guimarães Lessa:
624
"O ensino religioso nas escolas, diz o articulista, foi o
primeiro ponto vencido. Vamos agora à constituinte. E em
nome de Deus havemos de extinguir. No nosso caminho não
há espaço para os ateus. Que se definam. Que fiquem com o
seu ateísmo longe de nós. Que não perturbem a gloriosa
mancha que nós, católicos, preparamos para o Brasil... Não
tememos confronto. Não há espaço para a dubiedade de
caráter. Ou sim ou não. Ou católico e brasileiro ou ateu e não
brasileiro. Não transigiremos. Um ponto perdido equivale a uma
vitória de menos. E vitória de menos não nos cabe no
momento. Somos e seremos brasileiros. Católicos dentro do
nosso programa seremos grandes, generosos para os
verdadeiros brasileiros, os irmãos católicos..."
E segue o artigo neste tom para dizer mais adiante: "Aqui estaremos na
luta, se for preciso derramaremos sangue. A nossa luta será de ação. A da palavra
já passou".
Aí vai mais uma prova do perigo que ameaça o país!
Sob o título "Santificação da Família" o Estado de Minas Gerais, de 9 de
setembro de 1931, publicou o programa da Confederação Católica de Belo
Horizonte, de autoria do padre Álvaro Negromonte, cujo nome, já por demais
sugestivo, há de atravessar os séculos como um insulto à família brasileira, por fazer
dela vis espiãs e delatoras, a soldo de Roma:
625
"Visitar todas as casas da paróquia, examinandolhes
as necessidades espirituais”.
“O pároco divide a paróquia em grupos de casas por
quarteirões ou ruas, que serão confiados a uma senhora. Essa
divisão racional e metódica, feita sobre a planta da paróquia,
não deve deixar escapar nem uma casa. É prudente copiar a
divisão e arquivá-la juntamente com o nome e o endereço da
zeladora encarregada do grupo”.
“Para maior eficiência do trabalho, convém que os
grupos de casas não tenham muitas casas: 40, 50 no máximo”.
“O vigário, que deve conhecer bem suas
paroquianas, distribuirá os grupos às senhoras que mais
facilmente os puderem visitar. Entregar um grupo de casas a
uma senhora que morasse muito longe dele seria de antemão
inutilizar as esperanças, a menos que se tratasse de uma
verdadeira apóstola — o que é raro!”
“Nomeada, a encarregada começa imediatamente
sua tarefa; descobrir as uniões ilícitas, as crianças por batizar,
as que não freqüentam catecismo, as que não fizeram a 1ª
comunhão, os que não fazem a páscoa, os enfermos que
precisam de sacramentos, os que têm filhos em colégios
protestantes etc., etc. A zeladora para fazer essas sindicâncias
deve ter muito jeito, muita prudência. Muitas vezes, com o
simples curso de uma conversa bem orientada, chega-se mais
626
facilmente ao resultado desejado, do que com perguntas
diretas, importunas e irritantes.”
“Imprudência seria declarar que o fim da visita é
conhecer as necessidades espirituais... A visita se faz sob um
pretexto qualquer: um aniversário, um nascimento, um
batizado, uma moléstia, um luto ou em companhia de uma
amiga da casa e mil outros motivos que nunca faltarão a uma
mulher para visitar outras.”
“E... toca a conversar, que nessa conversa é que sai
tudo!... Aí se fica sabendo que são só contratados no civil, que
os meninos ainda não estão batizados ou não freqüentam o
catecismo, que aquele maiorzinho não fez a primeira
comunhão e até... as rusgas dos esposos.”
“De tudo o que se tiver informado, com prudência e
segurança, a zeladora tomará notas escritas e apresentará em
sessão para que se fique sabendo:”
1º — o número de casas visitadas;
2° — o número de uniões ilícitas;
3º — o das legitimadas;
4º — as crianças de mais de um mês por batizar;
5º — os batismos de adultos, tanto por fazer como
os conseguidos;
6º — as crianças que não freqüentam o catecismo;
7º — outras necessidades espirituais.
627
“Do que for apresentado em sessão do apostolado,
a secretária fará um relatório sucinto e completo para
apresentar à Confederação".
Isso motivou o seguinte protesto da "Liga Mineira Pró-Estado Leigo".
Diz ela: "Como se vê, é uma peça inteiriça de baixeza, na qual não se
vislumbra o mais leve resquício de senso moral, nem de respeito, o mais elementar,
ao pudor das famílias.”
Figura 23
Daí a César o que é de césar e a Deus o que é de Deus.
“Nossos honestos e recatados lares passam a ser
meras dependências das sacristias, em que os Negromontes,
por intermédio das suas devotas sob o piedoso pretexto de
'provar necessidades espirituais', se refocilarão na intimidade
de nossas famílias num trabalho soez de vil espionagem, de
nojentas cascovilhices, de beatério, tudo disfarçado por meio
628
das mil modalidades da hipocrisia, em que é tão fecunda a
luxuriante imaginativa clerical.”
“Institui-se a violação sistemática, a devassa
minuciosa dos lares, cujas intimidades, as mais secretas — até
as rusgas dos esposos, serão desvendadas voluptuosamente
na penumbra suspicaz das sacristias!”
“Para cúmulo da revolta, depois de descrever os
mais variados processos de espionagem, Negromonte, em um
ultraje aos sentimentos de dignidade e da verdadeira religião,
quer fazer instrumento de tão vil mister às zeladoras da
paróquia!”
“Isto é, às senhoras das nossas famílias, que por
fervor religioso e espírito de fé cooperam com elevação no
culto, competirá essa nojenta e degradante tarefa de
espionagem e de delação. Eis a que papel repugnante se quer
reduzir as senhoras católicas praticantes!”
“Diante disso, quem ousará abrir a porta da sua casa
a uma senhora que freqüente as igrejas católicas, sem receio
de ver uma emissária do padre Negromonte, disfarçada, a
farejar o recato e os segredos dos nossos lares?”
“Nunca tamanho ultraje foi atirado à mulher mineira,
cujo espírito de piedade religiosa e cujo fervor espiritual são
assim tão profunda e cruelmente ofendidos.”
“E em nome de Deus e para santificar as famílias se
aconselha e se institui essa torpeza!”
629
“De quanto é capaz o fanatismo religioso, na cobiça
desapoderada de dominar as consciências".
Pois bem, não pára por aí a petulância do clero romano no Brasil. Já se
formou um "Partido Político Católico" cujo desenvolvimento é fácil de conceber,
considerando-se a auréola de respeito fanático da massa ignorante e analfabeta.
A desfaçatez chegou a tal ponto que, na ocasião da preparação das
Câmaras eleitorais, o jesuíta francês Luiz Rion, de passagem por essas plagas
hospitaleiras, sentenciou o seguinte:
"A todo católico de ambos os sexos que não quiser
se alistar e votar nos candidatos indicados será negada a
absolvição dos seus pecados no Confessionário".
Se no peito do verdadeiro brasileiro ainda vibram algumas notas de
dignidade pátria e aquecem algumas brasas de liberdade de consciência, tão
dificilmente adquirida por todos os povos, que surja essa legião de patriotas e, como
domadora de feras, obrigue-as, quando mais não seja, a se manter calmas nos seus
tugúrios, como heroicamente fizeram na França, em Portugal, no México e, por
último, na Espanha. Sejamos brasileiros.
O que, porém, é de causar assombro é o ato que ia ser consumado por
Decreto já assinado pelo Chefe do Governo Provisório, Getúlio Vargas,
provavelmente iludido em sua boa-fé, referendado pelo então Ministro da Justiça,
Francisco Campos, concernente à supressão do Instituto dos Surdos-Mudos, no qual
se recolhem centenas de infelizes patrícios sem amparo que seriam enxotados dali,
630
para lá se recolherem ad vitam eterna, 700 jesuítas expulsos da Espanha, que aqui
haviam desembarcado.
Felizmente, o meigo Jesus, do seu empíreo, entristecido, soube guiar um
nosso patrício que o jornal O Jequitibá, de Presidente Soares, encobre sob as
iniciais T. C, o qual, armado com sua palavra, conseguiu desfazer tão iníquo quão
perverso ato.
O punhal do Jesuitismo, como se vê, tem o cabo em Roma e a ponta
voltada para o Brasil.
Oh! Vós, estrangeiros acatólicos que para aqui acudistes, após a
separação da Igreja do Estado em 1889, trazendo vossos capitais, vossa energia,
vossa inteligência, fugi! Aí vêm os padres Valente & Lessa! "Não há espaço para
vós!"
Como no tempo da monarquia, não tereis o direito de testar e até vosso
cadáver será recusado nas necrópoles ou desenterrado e jogado na rua como
fizeram há pouco os frades em Pernambuco!
Oh! Vós, brasileiros acatólicos, filhos deste torrão digno de melhor sorte,
dotado como é para ser o Paraíso terrestre, cujo sangue tem corrido nas
reivindicações dos direitos sociais, cujo suor tem enriquecido a mãe pátria, arrumai
as malas, separai-vos de vossas mulheres e filhos que não pactuarem com vossos
ideais religiosos e exilai-vos para... a China, ou para os sertões da África, porque lá
ao menos se respeitará vosso livre-arbítrio!
Oh! Pais; oh! Mães, que idolatrais vossos filhos, ouça, não nossa voz,
mas a voz da História, a voz dos séculos, a voz dos milhões de vítimas que vos
gritam: Alerta! Não cerreis os ouvidos! Vai nisso, não vossa felicidade que é
efêmera, mas a felicidade da Pátria que é eterna!
631
Não bastam os modernos exemplos da ultracatólica Espanha, da Itália, do
México?
E, mais tarde, se viverdes, podereis saber, até, que no Brasil como na
antiga Roma, vossa filha terá de entregar ao padre da freguesia, na primeira noite
nupcial, sua flor virginal, para ter sanção no ato matrimonial; e vossos filhos serão
castrados para destruir a maldita raça. Pode-se chegar até aí, no caminho em que
vamos.
E foi por essas e outras que todas as nações do mundo e o próprio
Vaticano condenaram e exterminaram várias vezes a perigosa corporação.
Os primeiros governadores do Brasil não cessavam, em suas cartas ao
rei, de pedir a supressão dos Jesuítas, pelos atos reprováveis e anti-humanitários
por eles cometidos contra os pobres silvícolas.
Leia-se a História do Paraguai, que fora possessão territorial dos jesuítas;
compare-se o embrutecimento da sua população durante aquele domínio, com a que
surgiu dali após a expulsão e digam-nos se devemos nos deixar escravizar
novamente.
Não entraremos no detalhe dos motivos que determinaram, no mundo
inteiro, o repúdio dessa terrível Camorra, pois centenas de livros existem que tratam
da sua formação, evolução, fausto, declínio, crimes e torpezas, cujo paralelo jamais
existiu entre as mais terríveis quadrilhas de salteadores.
Condenada várias vezes, por diversos papas, reabilitada por outros,
suprimida novamente, reconstituída mais adiante, guerreada por nações inteiras,
excedeu, por fim, descomunalmente os limites de uma satânica dominação e então o
mundo se revoltou e expulsou a nefasta corporação: a Boêmia e a Dinamarca em
1618 e 1767; Nápoles, Malta e Roma em 1622; a Índia em 1623; Veneza e Gênova
632
em 1606 e 1768; a Espanha, na pessoa do Marquês de Arranda em 1767; Portugal
e Brasil, na do Marquês de Pombal, em 1769; a França, na de Luiz XIV em 1762, a
Rússia em 1676 e 1820; o Papa Clemente XIV pela bula de 21 de julho de 1773,
pelo que foi envenenado em 1774; a Suíça em 1847; a Alemanha em 1827; o Papa
Pio IX em 1870, apesar de se ter servido dessa companhia para o reconhecimento
da infalibilidade; D. Inácio de Comonfort, no México, em 1854; o governo Calles e o
de Rubio no mesmo México em 1928-1932; as duas Sicílias etc. etc.
A China de Hang-Hi consentiu que os jesuítas ensinassem ali as ciências
físicas e matemáticas; mas a intolerância e a arrogância dos mesmos, que não
souberam compreender o pacífico espírito do governo, forçaram Yu-tchin, sucessor
daquele imperador, a afastá-lo da terra; e, Kien-Long, mais tarde, os baniu
definitivamente interditando-lhes a entrada no seu território.
O mesmo fez o Japão quando eles aconselharam os japoneses a jogar no
fogo as estátuas dos seus antepassados e a derrubar seus templos.
Só em 1889 o Japão permitiu a liberdade de cultos.
A Espanha, novamente, em 1931, após 400 anos de jugo, e muitos outros
países condenaram e expulsaram dos seus territórios tão nefando exército,
comprovadamente inimigo da civilização e da humanidade, para a qual a paz jamais
pôde existir e jamais existirá enquanto houver uma semente dessa erva daninha e
esta é difícil de extirpar, porque tão fácil é conhecer o jesuíta de sotaina, quão difícil
é conhecê-lo de casaca.
Pascal, o indubitável cristão, deu um golpe de morte no Jesuitismo, de
que se ressentiu fatalmente o Catolicismo, e, em 1660, os jesuítas tentaram obter do
Parlamento francês a condenação dessa obra, traduzida para o latim por Wandick.
633
Já no seu tempo, em suas Provinciales, ele não cessa de vergastar essa
Congregação, se bem que em Pensées ele defenda a religião cristã.
Bossuet, ultracatólico, pede que se vingue a santidade de Jesus Cristo e
sua moral pervertida pelos jesuítas.
Os papas Alexandre VII e Inocêncio XI confirmaram essa condenação.
O papa Clemente XIV, anteriormente citado, em 1773, lançou a seguinte
famosa bula — Dominus et Redemptor353.
"Nossos subseqüentes predecessores houveram
com a precitada Congregação, idêntica, senão mais ampla
munificência e liberalidade, Júlio III, Paulo IV, Pio IV e V,
Gregório XIII e XIV, Xisto V, Clemente VIII e outros soberanos
pontífices ou confirmaram ou aumentaram ou determinaram
mais exatamente os privilégios já outorgados a esses
religiosos”.
“Entretanto, o mesmo teor e forma dessas outorgas
apostólicas nos revelam que a Sociedade, quase na infância
ainda, viu erguer-se em seu seio vários germens de discórdias
e invejas, que só prejudicavam e desuniam seus membros,
senão também que os induziam a maldizer e conspirar contra
as ordens religiosas, contra o clero secular, academias,
universidades, colégios, escolas públicas e até contra os
soberanos que os acolheram em seus Estados; e que essas
dissensões nasciam, ora em razão da natureza e caráter dos
353 Matatias Gomes dos Santos— Os Jesuítas, páginas 141, 164 — S. Paulo, 1925 — Zorilla, Hist. de
los Frailes, T. 11, página 242 e segs. — Pedro Tarsier — Roma, o Jesuitismo e a Constituinte, 1933.
634
votos, tempo de admitir os noviços a pronunciá-los, da
competência de lhes conferir ou não as ordens sacras, sem
título algum, nem pronunciamento de voto solene, o que é
literalmente contrário às prescrições do Concilio de Trento e de
Pio V; ora vinham as discórdias a respeito do poder absoluto,
que o Geral se arrogava, e de outros artigos concernentes ao
regime da Sociedade; ora, finalmente, por amor de diferentes
pontos de doutrina dos colégios, das isenções e privilégios
concedidos honorifica-mente a diversas pessoas eclesiásticas
seculares, e em cujas concessões se pretendia ver quebra de
jurisdição e direitos. Finalmente, não houve acusação das mais
graves que se não fizesse à referida Sociedade e por muito
tempo andou perdida a tranqüilidade e paz da cristandade. Daí
romperam mil queixas contra esses religiosos, que foram
levadas a Paulo IV e transferidas a Pio V e Xisto V, não
somente os motivos graves e urgentes que determinaram este
papa a dar tal passo, e as reclamações que lhe haviam sido
feitas pelos inquisidores da Espanha contra os privilégios
excessivos da Companhia de Jesus e a forma do seu regime,
mas, também os pontos de disputa, aprovados por diferentes
membros da Sociedade, os mais notáveis por sua ciência e
piedade, solicitando deste pontífice uma visita apostólica para
sindicar os fatos”. (...)
“Todas essas precauções não puderam abafar os
clamores e queixas contra a Sociedade; ao contrário, então se
635
viu espalharem-se, recrudescerem, de mais em mais, por
quase todo o Universo, rigorosas contestações relativas à
doutrina desta ordem que muitos denunciaram como totalmente
oposta à fé ortodoxa e aos bons costumes.”
“No seio da Sociedade se ergueram discussões,
argüiram-na de buscar com excessivo ardor os bens da terra”.
“Tal foi a origem dessas agitações, por demais
conhecidas, que tanta dor e pesar causaram à Sé Apostólica;
tal é o motivo por que diferentes monarcas tomaram partido
contra a Sociedade.”
“Esses expedientes e vários outros tomados
posteriormente não tiveram, com amarga dor o observamos,
bastante eficácia, nem força bastante, para destruir e apaziguar
os distúrbios, as acusações e as encrespações feitas contra a
Sociedade.”
“Outros nossos predecessores, Urbano VIII,
Clemente IX, X, XI, XII, Alexandre VII, Inocêncio X, XI, XII e XIII
em vão se esforçaram para restituir a Igreja à desejada
tranqüilidade por meio de vários regulamentos e leis, quer
concernentes aos negócios seculares, dos quais a Sociedade
não poderia se ocupar no tempo ou fora do tempo das
missões, quer tendentes às graves desinteligências e vivas
controvérsias suscitadas por seus membros (não sem grande
escândalo) contra as autoridades, contra as ordens religiosas e
contra as comunidades de qualquer natureza, na Ásia e na
636
América, quer mesmo relativas à interpretação e práticas de
certas cerimônias pagas, admitidas ou toleradas em algumas
partes, omitindo as que são aprovadas pela Igreja Universal;
quer, também, com respeito ao uso e translação de certas
máximas justificadamente prescritas como escandalosas, e,
sem dúvida, contrárias aos bons costumes; quer, finalmente,
com relação a outros assuntos de máxima importância e
absolutamente necessários para conservar aos dogmas da
religião cristã toda sua pureza, integridade e esplendor, cuja
perda tem ocasionado, neste e nos séculos precedentes,
imensos abusos e males extraordinários, tais, por exemplo,
como lutas e sedições em diversos Estados católicos e até
perseguições contra a Igreja em algumas províncias da Ásia e
da Europa”.
“Todos os nossos antecessores tiveram com esta
sociedade vivas aflições; entre outros, o papa Inocêncio XI, de
mui piedosa memória, que se viu constrangido a proibir-lhe que
desse o hábito a noviços; Inocêncio XIII, que foi obrigado a
ameaçá-lo com a mesma pena; e, enfim, Benedito XIV que
decretou uma visita de investigação às casas e colégios
estabelecidos no Estado do nosso mui prezado filho em Jesus
Cristo, o rei fidelíssimo de Portugal e dos Algarves.”
“E nem depois a Santa Sé colheu consolação
alguma, nem a Sociedade proveito, nem a cristandade
vantagem das últimas cartas apostólicas de Clemente XIII, que
637
foram antes extorquidas (segundo a expressão de que usou
Gregório X no Concilio Ecumênico de Lion, já citado) do que
obtidas, e nas quais se exaltou ao infinito e se aprovou
novamente o Instituto da Sociedade de Jesus.”
“Depois de tantas borrascas, de tantos abalos e de
tão horríveis tempestades, os verdadeiros fiéis esperavam que
se visse, no final, raiar o dia que devia restabelecer a calma e a
paz profunda. Mas, no pontificado do mesmo Clemente XIII,
agravaram-se os males e a tormenta cresceu ainda mais. Os
clamores e as argüições contra a Sociedade aumentaram dia
após dia; em algumas partes ergueram-se tumultos,
dissensões, sedições perigosíssimas e não poucos escândalos,
que, partindo e aniquilando totalmente os laços da fraternidade
cristã, acenderam nos corações o espírito de partido, os ódios
e as inimizades.”
“O perigo cresceu a tal ponto que aqueles cuja
piedade e benevolência hereditária para com a Sociedade são
reconhecidas, queremos dizer, nossos mui amados filhos em
Jesus Cristo, os reis da França, Espanha, Portugal e Duas
Sicílias, viram-se na imperiosa necessidade de expulsar e banir
de seus reinos, Estados e províncias todos os religiosos desta
ordem, profundamente convencidos de que este meio extremo
era o único remédio a tantos males e o único a empregar para
impedir que os cristãos se provocassem uns aos outros, se
injuriassem mutuamente e se digladiassem no seio da própria
638
Igreja, sua mãe comum. Mas, esses mesmos reis, nossos mui
prezados filhos em Jesus Cristo, sabiam que tal recurso não
podia ter duráveis e salutares efeitos, nem bastava para
restabelecer a tranqüilidade no domínio cristão, se a própria
Sociedade não fosse em seguida inteiramente abolida. Por
isso, patentearam ao dito Clemente XIII, seus desejos, pedindo
a todos um tempo, escudados em sua autoridade, auxiliada por
súplicas e instâncias, que assegurasse com esse meio eficaz a
tranqüilidade perpétua de seus súditos e o bem geral da
Igreja.”
“A morte inesperada desse soberano pontífice fez
sustar o andamento e a conclusão de tão importante assunto.”
“Mas, apenas havíamos sido elevados pela
misericórdia do Senhor à Cadeira de São Pedro, quando logo
nos fizeram os mesmos pedidos, súplicas e instâncias, às quais
grande número de bispos e de outros personagens ilustres por
sua dignidade e ciência uniu os rogos e o apoio de sua opinião
favorável.”
“Contudo, para marcharmos com mais segurança,
lealdade e consciência em coisa de tamanho, peso e
gravidade, julgamos necessário espaçar o julgamento; a uma,
para procedermos a rigorosas pesquisas e escrupuloso exame;
a outra, para que o tempo nos deixasse deliberar com toda a
prudência necessária, e, também, para implorarmos do Pai
Eterno, que criou a luz, que nos socorresse com o auxílio da
639
sua luz divina, pelos nossos rogos constantes e pelas súplicas
e boas obras dos fiéis.”
“Importava, sobretudo, sabermos e examinarmos
que fundamento havia a dizer-se e de onde vinha essa crença
tão geralmente derramada de que o Instituto dos Clérigos da
Sociedade de Jesus fora aprovado e confirmado solenemente
pelo Concilio de Trento. E, pois, nos apraz aqui dizer que, das
indagações, concluímos que o mesmo Concilio fez menção
desta ordem, somente para excetuar do decreto geral, em que
se estabeleceu relativamente às outras ordens religiosas, que,
após o tempo do noviciado, os noviços seriam admitidos a
professar ou seriam demitidos da Sociedade, segundo os
julgassem dignos. Eis por que o precitado Concilio (Séc. 25,
capítulo XVI, de Regular) declarou nada querer inovar, nem
tolher tampouco a esses religiosos de servirem a Deus e à
Igreja nos termos do seu Instituto aprovado pela Santa Sé.”
“Assim, portanto, depois de madura reflexão,
auxiliados, ousamos crê-lo, pela presença e inspiração do
Espírito Santo; forçados, além disso, pelo dever sagrado do
nosso cargo, que nos impõe essencialmente a obrigação de
buscar, manter e consolidar o repouso e a tranqüilidade do
povo cristão, extirpar inteiramente tudo quanto possa causarlhe
o menor dano. Por outro lado, reconhecendo que a
Sociedade de Jesus jamais poderia tornar a produzir os
abundantes frutos e as vantagens consideráveis de que fora
640
instituída e a que deveu ser aprovada por tão grande número
de papas, nossos predecessores, e enriquecida com tantos
privilégios e que seria quase, se não totalmente impossível,
que a Igreja gozasse de paz verdadeira e sólida, enquanto a
dita ordem existisse.”
“Impulsionados por tão poderosas razões, as leis da
prudência e sábia administração da Igreja Universal, e que
deixamos cerrados no âmago do coração. Segundo o exemplo
e os passos de muitos dos nossos predecessores,
particularmente os de Gregório X, no Concilio Geral de Lion,
pois, da mesma sorte, ora se trata de uma Sociedade
compreendida no número das ordens mendicantes, assim pelo
seu instituto, como pelos seus privilégios. Após acurado exame
e porque temos real ciência de tudo: pela plenitude dos nossos
poderes apostólicos: nós suprimos e abolimos a Sociedade de
Jesus; ab-rogamos e dissolvemos todos e cada um dos cargos,
empregos e administrações, casas, escolas, colégios,
recolhimentos, hospícios e quaisquer outros estabelecimentos
que lhe pertençam, por algum título e de qualquer maneira e
seja qual for a província ou o Estado em que se achem
situados; anulamos seus estatutos, praxes, costumes, decretos
por aprovação da Santa Sé ou por outra diversa forma.”
“E, outrossim, anulamos todos seus privilégios e
indultos gerais e particulares, cujo teor, conceito e pensamento,
mandamos se considere tão plena e textualmente inseridos na
641
presente bula, como se, de fato, estivessem palavra por
palavra, e, não obstante qualquer fórmula ou cláusula em
contrário, todo o decreto ou lei em que se apóiem, fiquem
virtualmente compreendidas nesta supressão.”
“Declaramos, portanto, perpetuamente cassada, e
absolutamente extinta toda sorte de autoridade, seja espiritual,
seja temporal do geral das províncias, dos visitadores e outros
chefes desta Sociedade e transferimos essa mesma autoridade
inteiramente, sem a menor restrição, aos superiores das
dioceses, conforme as circunstâncias e as pessoas, na forma e
condições que em seguida notificaremos — proibindo, como
pela presente proibimos, que doravante se receba na dita
Sociedade, quem quer que seja, que se admitam noviços ou se
dê hábito a alguém.”
“Impomos expressamente à consciência dos bispos
o velar pela execução de todas essas coisas, lembrando-lhes
de pensarem incessantemente na rigorosa conta que terão de
dar a Deus, um dia, do rebanho confiado à sua guarda e
cuidado e de se lembrarem da terrível sentença com que o
Soberano Juiz dos Vivos e dos Mortos ameaça os que no
mundo governam. Se entre os membros da Sociedade que
extinguimos, alguns eram encarregados da instrução da
mocidade ou que exercessem o mister de professor em
qualquer escola ou colégio, ordenamos: que, privados
absolutamente de toda a direção, administração e autoridade,
642
não se lhes conceda continuarem em tais ocupações a menos
que se leve a toda a evidência que deles se colherá grande
fruto e se mostrem bem, realmente, despreocupado dessas
discussões e pontos de doutrina, cuja tibieza e futilidade
ocasionam na maioria das vezes, inconvenientes e
contestações mui funestas; e decretamos que as ditas funções
se]a.m perpetuamente interditas àqueles que se não
esforçarem por manter a paz nas escolas e a tranqüilidade
pública e mesmo sejam privados do cargo que já estiverem de
sua posse. Depois da publicação desta bula, nós proibimos que
ouse, quem quer que seja, suspender-lhe a execução, quer a
título, sob pretexto, escusa e aparência de demanda, apelo,
recurso, declaração ou consulta acerca das dúvidas que
possam sobrevir, quer, mesmo, sob outro pretexto qual for,
previsto ou imprevisto; pois queremos que a supressão e
anulação de toda a Sociedade tenha desde esse momento ou
imediatamente pleno, inteiro e vigoroso efeito, pela forma e
maneira prescritas sob pena de incorrer em excomunhão
maior, reservada a nós, papas, nossos sucessores, contra
aqueles que ousem opor o menor obstáculo, impedindo ou
dilação à execução deste Breve. A todos os monarcas e
príncipes cristãos, em quem reconhecemos respeito e afeição
pela Santa Sé, exortamos a empregarem para inteira e plena
execução deste Breve, todo o zelo e cuidado, toda a força,
autoridade e poder que receberam de Deus, a fim de
643
defenderem e protegerem a Santa Igreja Romana; a aderirem a
todos os artigos que nele se contém, a darem e publicarem
idênticos decretos, pelos quais venham com segurança evitar
que a execução da nossa presente vontade, não derrame entre
os fiéis, nem querelas, nem contestações, nem desuniões...
Ainda mesmo quando os superiores e outros religiosos desta
ordem, bem como os que tenham ou pretendam ter interesses,
de qualquer natureza, no que acima fica estatuído, não
sancionassem o presente Breve, nem fossem chamados, nem
ouvidos, queremos e decretamos que jamais o possam atacar,
destruir ou invalidar, por sub-repção e nulidade, ou
irregularidade, falta de intenção de nossa parte, ou qualquer
outro motivo por maior que seja, imprevisto e essencial, nem
por omissão de formalidade de preceitos que se devessem
observar nas disposições precedentes, ou algures, nem por
nenhum outro ponto capital, resultante de direito ou praxe,
embora compreendido no Corpus júris; sob pretexto de uma
enorme, muito grande e inteira lesão, nem finalmente por
nenhum outro pretexto, razão e escusa por mais justos,
razoáveis e privilegiados que pareçam, mesmo tais que fosse
necessário expressá-los, para validade dos regulamentos
supra.”
“E proibimos que o presente Breve seja retratado,
discutido, levado a tribunais; ou contra ele se promova recurso
de restituição por inteiro, e discussão de redução pelas vias e
644
termos de direito ou por qualquer outro meio para obter de jus,
de fato, por mercê, por justiça, ou por outra maneira de que
possam lícita ou ilicitamente servir-se tanto em justiça como de
outro modo.”
“E, sim, queremos expressamente que a presente
execução seja, de agora e para sempre, válida, imutável e
eficaz; que tenha inteiro e pleno efeito e seja inviolavelmente
observada por todos e cada um daqueles e quem observá-la
compete e venha de futuro a competir de qualquer maneira.
Queremos, pois, assim e não diversamente, que nenhum juiz
ou delegado, nem mesmo os auditores das causas do paçoapostólico,
nem os cardeais da Santa Igreja Romana, os
delegados a latere, os núncios da Santa Sé, nem algum outro,
qualquer que seja, ou haja de vir a ser o seu poder e
autoridade (papas), possua, em que instância ou causa for,
julgar e interpretar o presente Breve, de forma a tirar-lhe a força
e a faculdade; e acontecendo que ele sofra a menor queda e
diminuição, cientemente ou por ignorância, de antemão
declaramos nulo e de nenhum efeito o julgamento, seja de que
autoridade for.”
“Finalmente, nós mandamos que, tanto em juízo
como fora dele, se dê à simples cópia deste Breve, a mesma fé
que se lhe daria se fosse exibido e exposto no próprio original,
mesmo impressa, uma vez que seja subscrita por um notário
645
público e munida de selo de qualquer pessoa revestida de
autoridade eclesiástica.”
“Dado em Roma, em Santa Maria Maior, sob o anel
do Pescador, aos 21 de julho de 1773, 5º ano do Pontificado".
Clemente disse suspirando: "Assino minha sentença de morte, mas
obedeço à minha consciência".
E, de fato, sem entrarmos em pormenores que se encontrarão nas citadas
obras, ele morreu em 22 de setembro de 1774, após terríveis efeitos de um
envenenamento lento que lhe apodreceu o corpo ainda em vida. De quem é a obra?
Ora, após uma bula, como esta, tão jurídica, minuciosa, previdente e
peremptória como a própria morte, lançada por um papa infalível, cujos decretos
nunca podem ser revogados, cheia de excomunhões aos próprios papas futuros que
pretendessem anulá-la, cujos direitos, mesmo humanos, lhe foram cassados ad
vitam eternam, como compreender o ressurgimento dessa perniciosa Instituição,
inimiga da humanidade?
É que a Igreja Romana, anticristã, sempre precisou de uma legião de
homens sem alma, de sensibilidade empedernida, ferozes carrascos, para trucidar e
queimar todo aquele que pretender esclarecer seus semelhantes no caminho errado
que lhes apontam e cuja meta é a hegemonia mundial da sua política.
É que a Igreja Romana sabe que a maioria de seus adeptos, em todos os
países do mundo, é constituída de analfabetos, e a pequena minoria dos letrados ou
semi-letrados ignora esses fatos da História do Catolicismo, que ela confunde com o
Cristianismo de Cristo.
646
Daí a razão das adesões a esse culto por alguns homens eminentes nas
letras e nas ciências positivas, mas ignorantes em matéria da História em apreço
que não leram e não podem ler, por lhes ter sido proibida sob terríveis penas
espirituais e excomunhões.
E é a esses homens que se entrega a direção de uma nação?
Cromwell, grande estadista inglês, perseguia e matava muito
angelicamente, dizendo que era para obedecer a Deus que tal fazia!
Eles possuem um arsenal de fórmulas de variadas experiências para
atacar ou defender os mesmos princípios, conforme convier mantê-los ou aniquilálos.
Há capítulos de restrições mentais, de transações e acomodações, de
capitulações de consciência e de interpretações de compromissos etc.
Doelinger disse que por onde passa o espírito jesuítico a boa erva não
mais cresce.
Citemos ainda Mater, o fervoroso apologista católico, irradiando alguns
conceitos da sua obra Les Jesuites, edição de 1931.
Diz ele na página 187:
"... emigraram para a América e aí se instalaram
como brancos entre negros".
"... pois os fiéis brancos ou boçais precisam de
certezas que os dispensem de refletir e não de revisões
doutrinais que se agitam sem interessá-los." "Seu sistema
conduz a substituir por um automatismo religioso a inteligência
da religião e dos religiosos."
647
"Em seus colégios eles ensinam a religião o menos
possível e recomendam que não se fale em Deus, nem das
noções ligadas às de Verdade da Fé."
Quem vai confirmar isso agora é o próprio jesuíta Porée, o mais famoso
educador francês e professor do célebre Voltaire...
Diz ele: "... é uma loucura ligar-se importância a coisas estéreis e
puramente fantásticas. Para que falar da existência de Deus e da imortalidade da
alma? Tudo isso só serve para trazer inquieto o coração e criar dúvidas indiscretas.
É bom falar-se nisso, algumas vezes, mas como de passagem, para demonstrar
desejo de provas".
Fontenelle, também discípulo de Porée, disse:
"Eu tinha dez anos quando comecei a não entender
mais nada de religião."
"Assim professam os jesuítas que recebem a
formação teológica a mais minuciosa e praticam entre eles a
piedade a mais esclarecida; fazem da religião para os fiéis,
uma matéria de disciplina; mas não de discussão. Dir-se-ia que
eles se inspiram na frase de Voltaire: 'É preciso uma religião
para a canalha!' 'Sob pretexto de formar homens do mundo e
homens cortesãos eles fabricam dançarinos e cortesãos'."
"O fim do jesuíta é combater contra tudo que
incomode Roma."
648
Môhler, um dos acatados teólogos da sua época, escreveu:
"Sua maneira de tratar a moral é por vezes um
veneno que atingiu a vida cristã até a medula; ela fez
desaparecer toda a profundeza religiosa, toda a regra de
santidade e impediu toda a disciplina eclesiástica séria".
"A dogmática na mão deles tornou-se um esqueleto
dissecado, uma abstração sem vida."
Sob a máscara da paciência, da prudência e da moderação se encobrem
a dissimulação, a astúcia e a perfídia.
Na Irlanda, os jesuítas fabricavam velas para o altar com a banha dos
protestantes.
Quando se intrometem nas discussões é só para embaralhá-las e
obscurecê-las.
Chegou-se, mesmo, a dizer que a delicadeza e a gentileza de um jesuíta
eram um artifício do diabo.
Eis uma linha tirada da sua Disciplina:
"Flagelaram-se gritando: 'Cessa de revoltar-se asno
insolente, contra a razão, tua senhora. Trata de sacrificar a
vontade, mas não a carne. Antes de tudo é útil ter um ódio
absoluto e sem reserva em relação ao que o mundo ama e
abraça' ".
649
Em teoria, essa obediência cega não é prescrita pelas regras da Ordem;
mas, na realidade, ela é praticamente exigida de todos. Os que resistem são
expulsos por falta de vocação e atrozmente perseguidos, como se está passando
atualmente (1932) contra o Jesuíta Bremer, na Alemanha354.
O Jesuíta Przywara355 estabeleceu o seguinte dilema:
"A obediência cega é a pedra de toque do verdadeiro Catolicismo", daí
tiraram o paradoxo: "pela boca do Papa é sempre São Pedro que fala, pouco
importando que este papa seja pessoalmente indigno e se pareça com o anti-Cristo,
isto é, leve uma vida privada às avessas da vida modelo do Cristo".
Apavorante, porém, seria esta outra calamidade:
"Houve, em Flandres, em 1631, duas inglesas que
instituíram a 'Congregação das jesuítas femininas'.”
“O Papa dissolveu-a. Os jesuítas, porém,
sofismaram a coisa e criaram o 'Sagrado Coração de Jesus’ ".
Que são essas dezenas de Congregações femininas que acabam de ser
importadas da Europa, senão modalidades jesuíticas, acobertadas pelas asas de
uma simulada caridade?
Houvesse uma séria devassa policial e reconhecer-se-ia que meia dúzia
de crianças asiladas ali não passa de simples rótulo ou isca. Já tem mesmo surgido
escândalo pela imprensa que, infelizmente, é logo arrolhada!
Juridicamente, para o Vaticano, o Brasil faz parte da Província dos
Jesuítas que encerra Roma, Alemanha e Portugal.
354 Maler — Un scandaleux procés èclésiastique — Le General des Jesuites, Pie XI et le cas Bremer.
355 Le Pape-Roi.
650
Entretanto, o Brasil revolucionário de 1930 abriu-lhes as portas de par em
par, quando todas as nações lhes fechavam, e oficialmente compareceu à festa que
o soi-disant povo organizou em honra dos jesuítas, em 2 de abril de 1931, para o
assentamento da pedra fundamental da futura estátua de Inácio de Loyola!
Já é!
Se essas poucas linhas, que encerram vasto programa dos tempos
medievais e inquisitoriais, não conseguiram despertar vossa alma de verdadeiro
cristão, de verdadeiro discípulo do meigo Jesus, que pregou a paz e o amor ao
próximo, correndo a vergalho essa legião de padres, frades e freiras estrangeiros,
aventureiros improdutivos que acabam de invadir o Brasil, após a repulsa em massa
de todos os países do mundo, então que seja feita vossa vontade que, certamente, é
a de Deus, para vos castigar com a tremenda provação por que tereis de passar.
Quando reconhecerdes o erro, como acaba a Espanha de constatá-lo, após 400
anos de catecismo, tarde será porque o mal já terá corroído o sangue de 85% de
pobres analfabetos, a nação estará financeiramente reduzida a ser vendida a retalho
à Europa pela remessa de toda sua fortuna e novos séculos serão precisos para
refazer uma nova geração inteligente, livre e honesta, como sucedeu a Portugal e
está sucedendo ao México.
Os que se filiam ao Jesuitismo têm de prestar o solene juramento que
segue:
"Juro não poupar indivíduo algum pertencente ao
infame partido dos liberais, não ter compaixão nem das
lágrimas das mulheres, nem das crianças, nem dos gemidos
651
dos velhos e derramar até a última gota do seu sangue, sem
consideração pelo sexo, idade ou categoria356".
Entre milhares de crimes inauditos, citemos somente parte dos que
cometeram contra os monarcas e outras entidades salientes na direção dos povos:
Envenenaram o papa Clemente VIII e todos os que haviam incitado e
auxiliado o papa Clemente XIV que abolira a ordem. Idem a Clemente XIII que havia
aventado essa idéia. Henrique IV foi assassinado pelo jesuíta Ravaillac. A rainha
Elisabeth, por Babington jesuíta. Luiz XV ferido pelo jesuíta Roberto F. Damiens.
Henrique III assassinado com uma punhalada no baixo-ventre pelo jesuíta Jacques
Clement, dominicano. Urbano VI envenenado. Leão XI envenenado. Cardeal Touinn
envenenado. O legado Mezabarba envenenado etc. etc.
O cúmulo da hipocrisia e da desfaçatez do Catolicismo é transformar em
culpados as vítimas dos crimes praticados por seus algozes.
Por isso disse Voltaire, ex-discípulo dos jesuítas:
"Persécuteurs du genre humain”
"Qui sonnez sans miséricorde,”
"Que n'avez vous au cou Ia corde”
"Que vous tenez de votre main?"
O Jesuitismo tem como essência o espírito de divisão. E como se chama
esse espírito já nomeado por Cristo? Satanás!
356 M. Lachatre — volume 5°, página 240.
652
Ensino Religioso
Até nesta denominação já se descobre o maquiavelismo da Igreja
Romana, porque tão religiosos são os ensinos do Budismo, do Maometismo, do
Ortodoxismo ou de qualquer seita quanto o são os do Cristianismo.
Há nessa qualificação o evidente intuito especulativo de tornar sinônimas
as duas expressões: Ensino Religioso — Ensino Católico; repudiando qualquer
outro ensino que se apresente à concorrência.
Ora, todo ato que encobre uma segunda intenção não pode de modo
algum cheirar a santidade, antes tresanda ao Jesuitismo.
A polêmica havida entre a Associação de Professores Católicos e a
Diretoria Geral de Instrução Pública, cuja magistral resposta final foi publicada pelo
O Globo, em 16.7.33, bem esclarece a intenção da Igreja.
Felizmente, ainda temos homens no Brasil para salvar a Pátria! O reino do
céu é dos ignorantes, diz a Igreja Católica! Pudera!
Fosse ela permitir que a célebre maioria de católicos no Brasil, constituída
de 85% de analfabetos, se ilustrasse, aprofundando a origem e a formação do seu
Culto, pesquisasse os embustes atirados à credulidade das massas, seria o
aniquilamento do monumento Vaticanício em mais breve tempo do que era de
esperar, porque é das economias dessa pobre gente que ele ostenta o luxo. Daí o
esforço que faz o Jesuitismo em reter o mais que pode a vertiginosa queda da Fé.
Pois é evidente que essa Fé já se não parece com a Fé dos primitivos tempos do
Cristianismo, em que só o Poder espiritual predominava; hoje essa fé é um pretexto
para se elevar ao Poder Temporal e ao Governo do Mundo. É a mistificação pelo
misticismo.
653
Bem sabe a Cúria Romana que não é o arquiteto que delineou o plano
que vai construir o edifício; são os obreiros que, embora de crenças contrárias ou
indiferentes, erguerão o templo, uma vez que lhe paguem seus salários. Mas a
evolução humana nada faz aos saltos; o que nos parecem hoje revoluções políticas
nacionais, como as que têm infelicitado nossa pátria, quando encabeçadas pelo
bispo, pelo vigário geral (como sucedeu em São Paulo), não passa, no fundo, de
momentânea anarquização espiritual das massas, pelo veneno que a Companhia de
Jesus continua inoculando por toda parte, como a mira no Poder, para repor no
trono sua supremacia.
E tu, pátria nossa, que esperas?
Que sejas completamente subjugada pelo polvo, cujos tentáculos já se
apoderaram de vários Estados, que atravesses alguns séculos de atraso, como
sucedeu à Alemanha, à França, à Áustria, à Portugal, à Espanha, à Itália, à América
do Norte, ao México, à Argentina etc., acabando todos com o repudiar, como
nefastos, os famosos ensinos católicos, para, finalmente, fazerem o mesmo que
elas?
Para que sofrer tão rude experiência, já sofrida por essas nações? Para
que deixar derramar nas nossas escolas o veneno já bebido por elas?
Deixai, só, que pobres mães ignorantes e fanatizadas propinem esse
veneno aos seus filhos; mas não permitais que se torne obrigatório o suicídio
espiritual de uma nação inteira.
Bendito será o homem que abrir os seus olhos.
No Estado de Minas Gerais, no reinado de Antônio Carlos, impôs-se o
ensino católico obrigatório nas escolas públicas. Desse modo, rasgou ele a própria
Lei Básica da República, que separou a Igreja do Estado, concedendo liberdade de
654
crenças e cultos aos cidadãos brasileiros e estrangeiros que aqui habitam, negando,
com esse ato, a liberdade do povo brasileiro e escravizando-o a uma seita
repudiada.
Mas que vem a ser, em suma, esse tão falado Ensino Católico?
Um grande estadista francês, perguntando aos clericais perante a
Câmara, dará, por nós, a resposta:
"Que podeis vós ensinar às crianças quando não há
um só filósofo, um só historiador, um só orador, um só
naturalista, um só fisiologista, um só pensador, em suma,
desses homens perante os quais se ajoelha a consciência
humana, que não esteja condenado e excomungado por vós?"
Não basta isso? Pois, queiram ler o próprio Sílabos, livro de Leis do
Vaticano, em seu artigo 80, de 8 de dezembro de 1864, que diz: "É erro condenável
supor-se aceitável ou exeqüível a reconciliação da religião com a ciência, o
liberalismo e a civilização moderna". A instrução é a causa da demagogia, disse Pio
IX em outra ocasião.
E por que a Igreja Católica é inimiga do progresso da humanidade?
Porque ela se baseia na frase da Bíblia quando Deus proíbe a Adão de tocar no
fruto da árvore da ciência do Bem e do Mal. Ora, diz ela, se Deus proibiu à
humanidade o conhecimento da Ciência, justo é que se queimem e persigam todos
os cientistas. Ademais, se o reino do Céu é dos ignorantes, claro é que se devem
extirpar os doutores pela fogueira, salvo, bem entendido, os que fazem parte da
agremiação.
655
Foi Tertuliano quem criou o seguinte aforismo sobre o qual a Igreja
Católica se guiou durante séculos, destruindo, desse modo, todo o incitamento às
ciências que ela condena: "Não precisamos de nenhuma ciência, depois do Cristo,
nem de nenhuma prova depois do Evangelho; aquele que crê não deseja mais nada;
a ignorância é boa, em geral, a fim de que se não aprenda a conhecer o que é
inconveniente".
Por isso a ciência estacionou durante séculos. Aquele que acreditasse
nos antípodas, isto é, que a terra era redonda, era considerado herege e a fogueira
o esperava.
É na Concordata de 1855, feita entre a Cúria Romana e a Corte de Viena,
que se conhecem a fundo os verdadeiros fins do papado em relação à sociedade
moderna.
Combes, o grande estadista francês, disse perante o parlamento que
"acorrentar a razão humana a uma fórmula, quando não existe outro fundamento
senão a fé, equivale a obrigar o homem à dúvida, à negação e à heresia".
"A república, como governo da razão humana, não
pode admitir a seu lado outra potência que não esteja debaixo
da sua fiscalização."
"A coexistência das duas autoridades, temporal e
espiritual, é uma anomalia em uma república."
E Herriot, o moderno chefe do gabinete francês cuja ação a respeito da
paz mundial é notável, reconhece que o progresso (de uma nação) consiste em
separar mais e mais a religião da política.
656
"Quando se unem estas duas coisas sobrevêm as
perturbações sociais."
E o Brasil procura fazê-lo!
Para melhor avaliarmos o que vem a ser o ensino religioso nas escolas
brasileiras, ouçamos o padre Guilherme Dias, ainda no tempo da monarquia, quando
o Estado andava amarrado à cruz.
Diz ele em Ecos de Roma, publicado em 1873:
"Nas escolas primárias e secundárias, em que se
deve preparar o espírito, não se tem ensinado o homem a ser
cidadão, familiar, social, bom, virtuoso, pundonoroso,
humanitário, honrado e trabalhador; não se tem ensinado a
mulher a ser boa filha, desvelada esposa, carinhosa mãe,
virtuosa, dócil, dedicada ao trabalho, boa educadora e
administradora. Nada disso. O ensino escolar nos Estados
Católicos é... católico!”
“Não se educam cidadãos nas escolas católicas,
criam-se escravos do papa. Não se instrui o homem nos
direitos e deveres civis e políticos, ensina-se a adorar o Papa e
seu infinito exército de Santos. Não se ensina o respeito da
Consciência, negam-se os seus direitos. Não se evangeliza a
liberdade, ensina-se o despotismo e encaminha-se o homem
para o fanatismo. A educação católica, apostólica e romana, e
era essa a única que tínhamos até há pouco e ainda assaz
657
preponderante, neste império, é tão oposta à verdadeira
educação social e constitucional, como o papismo é adverso e
oposto ao liberalismo, e vem dessa educação os vícios da
sociedade atual e vêm dela as inclinações e simpatias de
alguns chamados liberais pelo papismo. Apesar da aberta
oposição, mais do que isso, da absoluta incompatibilidade do
papado com o liberalismo, por exemplo, o governo do Brasil,
como o de Portugal, sustenta um grande número de seminários
destinados a viveiro do Catolicismo e muitos dos denominados
'liberais' mandam educar neles seus filhos e netos.”
“E temos, infelizmente, quem pense ainda que não
se pode dispensar tal educação católica, apostólica e romana,
que é a educação dos mistérios, dos preconceitos, dos
prejuízos, dos absurdos, da condenação, da inteligência, da
consciência, da liberdade e do... ócio.”
“Os padres católicos romanos não têm família ou a
têm bastarda e condenada; como hão de eles ensinar e
exemplificar os direitos e os deveres da família, que são os
primeiros que se devem ensinar às crianças, destinadas a
estabelecê-la?”
“Os padres romanos não têm pátria; como hão de
incitar as crianças ao verdadeiro patriotismo?”
“Os padres romanos negam a liberdade; como hão
de eles instruir a mocidade nos princípios liberais?”
658
“Os padres romanos tiveram uma educação toda
fantástica ou mística, como hão de eles ensinar às crianças os
direitos e deveres que são positivos? Os padres romanos sem
família e sem pátria são egoístas pela educação e posição,
como hão de mover as crianças no amor pelos outros, à
devoção cívica, à obrigação e aos princípios da
confraternidade? Os padres romanos com uma educação
hipócrita e hábitos hipócritas, como hão de educar a mocidade
pelos princípios da verdade e da franqueza? Os padres
católicos, interessados, interessadíssimos, no obscurantismo,
na cegueira dos povos, no embrutecimento geral, como hão de
empenhar-se na ilustração da sua vida que os desmascararia?”
“Enfim, os padres católicos, apostólicos e romanos,
tendo recebido uma educação católica, apostólica e romana,
como podem dar aos mancebos uma educação social,
constitucional e humanitária, absolutamente oposta à deles?
Se é inquestionável o princípio de que ninguém pode dar o que
não tem, os padres romanos, por melhor boa vontade que
tivessem, mas, não a podem ter, não poderiam dar ao povo
uma educação que eles não têm e que só conhecem para
detestá-la.”
“O Catolicismo transformou os homens em escravos
e a escravidão mata a inteligência, mata o brio e o pundonor,
mata o amor à família, mata os estímulos nobres, mata, enfim,
659
tudo o que podia mover à nobreza, à generosidade, ao brio e,
dizem mesmo, mata até o próprio católico".
Não há pior cego do que aquele que não quer ver.
Apesar da História nos mostrar, incessantemente, a indesejabilidade do
ensino desse credo, pavor de todos os governos do mundo, o Brasil inteligente foi
abalado com o decreto forjado pelo Ministério da Educação, facultando,
mascaradamente, o ensino religioso nas escolas! Bastou que surgisse tal
mentalidade, não como representando facção alguma da nação, mas como mero
instrumento da Cúria romana, para destruir o trabalho de uma Constituição modelar,
na própria opinião dos Papas, o sossego e a paz de 42 anos em que tem vivido a
nação e a própria liberdade em que viveu a igreja nesse longo lapso de tempo.
E, para que se não diga ser animadversão da nossa parte, o que acima
fica, transcrevemos, em seguida, a declaração que o outro projeto fez perante a
"Legião Revolucionária", em Belo Horizonte: "Os compromissos que assumimos
para com a Igreja Católica não constituem um desses artifícios políticos com que no
Brasil se costumava ludibriar as forças para as quais políticos apelavam?!"
E, que tal a franqueza?!
Os protestos afluíram de Norte a Sul. Ligas se têm formado sob a direção
da "Coligação para o Ensino Leigo" e a "Questão Religiosa" acaba de ser instituída
no Brasil.
Isso motivou de nossa parte a seguinte carta ao Exmo. Sr. Chefe do
Governo Provisório:
660
"Do Norte ao Sul do país V. Ex. tem recebido e há
de continuar a receber os mais veementes protestos com
relação ao decreto acerca do Ensino Religioso.”
“Isso já é um prenuncio de que a alma da nação
brasileira, adormecida durante quase meio século, em um
ambiente de paz, foi acordada, em sobressalto, por um terrível
pesadelo, pois quero crer que isso seja um sonho passageiro,
que V. Ex. dissipará com a luz da liberdade que irradiava do
facho que empunhou nos campos sulinos, porquanto, não é
possível que V Ex., ilustradíssimo como é, ignore as própria
palavras do Sílabo: 'É em condenável supor aceitável ou
exeqüível a reconciliação da religião com a ciência, o
liberalismo e a moderna civilização'.”
“V. Ex., como velho político, deve igualmente
lembrar-se das palavras de um deputado francês, perante o
parlamento, por ocasião da separação da Igreja do Estado,
dirigida ao clero católico: 'Que podeis vós ensinar às crianças
quando não há um só filósofo, um só historiador, um só orador,
um só naturalista, um só fisiologista, um só pensador, em
suma, desses homens perante os quais se ajoelha a
consciência humana, que não esteja condenado e
excomungado por vós?' “
“V. Ex., certamente, deve ter prestado atenção na
reação que a alma espanhola, saturada do tão decantado
ensino religioso, acaba de manifestar a: mundo; V. Ex., sem
661
dúvida, volveu seus ouvidos para os gritos de 'Morte ao Papa',
'Morte ao Traidor', 'Abaixo o Vaticano', que acabam de
repercutir do próprio foco do Catolicismo, em Roma, e saídos
do peito da mocidade católica; V. Ex. conhece, de sobra, as
terríveis lições da história da humanidade nos tempos
medievais e mesmo moderno, como o que nos acaba de dar o
martirizado México desde o tempo dos Corteses; V. Ex. já terá
ponderado as conseqüências retrógradas ou atrofiantes do
progresso do Brasil monárquico; V. Ex., em suma, não há de
ter esquecido suas próprias palavras no parlamento quando,
em boa hora, representava a nação.”
“E, num grito nobre, inteligente, altamente patriótico
e humanitário revogará, decerto, aquele decreto, a fim de
receber as bênçãos dos cidadãos brasileiros e estrangeiros
aqui residentes, embora se moleste o sentimento religioso de
uma facção, por maior que ela seja, a qual, aliás, não fica
tolhido direito algum de expansão. Assim o espera o mais
ínfimo criado de V. Ex."
Oxalá, que, no futuro, não venhamos assistir à tragédia por que acaba de
passar a ultracatólica Espanha, conforme se verifica no seguinte telegrama passado
pelo próprio Vaticano:
"Acaba de ser publicado o relatório oficial dos
prejuízos sofridos pelos jesuítas espanhóis por ocasião dos
662
últimos acontecimentos de Madri e nas províncias da
Espanha.”
“Por esse documento verifica-se que na Capital
foram incendiados e reduzidos a cinzas uma casa de
Professores com a igreja que lhe ficava contígua e onde
repousavam os restos de São Francisco de Bórgia e o grande
Instituto técnico de formação de engenheiros, contra-mestres e
operários. Em Málaga, um convento. Em Sevilha, um colégio.
Em Alicante, um asilo onde florescia a obra de educação dos
filhos dos operários. Foram ali saqueados, também, outros
estabelecimentos de Jesuítas, entre os quais alguns colégios.
Em Málaga e Valência foram incendiadas e destruídas duas
escolas. Em Sevilha foram igualmente saqueados
estabelecimentos, em que 300 operários recebiam instrução
gratuita, ministrada por 20 professores, e mais duas casas,
uma para operários sem trabalho e outra para auxílio aos
presos. Os jesuítas foram obrigados a deixar muitas outras
casas que estavam ameaçadas de incêndio pela população;
três noviciados em Aranjuez, Gandia e Salamanca, três
colégios em Cruela e Gigon e a Casa dos Escritores em Madri.”
“Relativamente às outras casas de religiosos, o
balanço diz que foram incendiadas ou devastadas entre 100 e
200 pertencentes aos padres Dominicanos e aos
Capuchinhos.”
663
“Em Andaluzia, parte das Comunidades religiosas da
região teve de ser dispersada.”
“Os Salesianos tiveram também algumas casas
incendiadas, entre elas o grande colégio de Alicante. Também
foi destruído pelo fogo o Colégio de Madri dos Irmãos das
Escolas Cristãs. O Convento de religiosos de Pueblo Nuevo foi
incendiado.”
“As religiosas da Companhia de Maria foram
obrigadas a abandonar os conventos em Manreza, Lerida,
Saragoça, San Lucas, Madri, Corunha e Xerez. O Convento
desta ordem em Alicante foi totalmente destruído pelo fogo com
tudo o que continha.”
“As irmãs do Sagrado Coração de Maria perderam
sua Grande Casa de Chamartin, perto de Madri.”
“Quando o externato desta Ordem estava ardendo, a
Madre Superiora pediu benevolência para as crianças e para
as religiosas velhas. O pedido foi atendido e o fogo extinto
pelos próprios populares e pelos bombeiros. As religiosas
deixaram depois o edifício secretamente. Os prédios que
arderam foram evidentemente saqueados antes pela
população. O Relatório que acompanha o Balanço termina
assim: todas essas devastações foram obra de elementos
comunistas, que pareciam verdadeiramente organizados e
procuravam horas em que era impossível qualquer defesa".
664
Poderá haver prova mais evidente da ineficiência de tal ensino? Não
prevalece a insinuação supra de serem tais acontecimentos promovidos por
comunistas, pois o sentimento político, propriamente dito, não levaria as populações
de todas as províncias a destruir as escolas, os asilos e os templos da sua devoção,
perseguindo seus professores espirituais, de uma a outra extremidade do país.
Pode-se ser católico, apostólico e romano e ao mesmo tempo reacionário político.
Uma coisa nada tem com a outra. Mas, uma vez que este reacionário político se
volta para seu templo, a fim de destruí-lo, é porque seu espírito religioso sentiu que a
causa do seu atraso e a falta de liberdade provinham dali e o meio de externar a
reprovação não pode deixar de ser outro.
E quem vai confirmar nossas palavras é o jesuíta espanhol Pascual Godo,
expulso da Espanha nessa ocasião, quando de passagem pelo Rio de Janeiro
declarou o seguinte à nossa imprensa: "Diário da Noite, 20.2.1932:
“A queda do trono espanhol e a implantação do novo
regime em meu país trouxeram uma grande desilusão para
todos aqueles que acreditavam ser a Espanha um dos países
mais católicos do mundo. O que se passou, então, em quase
todo o país, com a destruição e o incêndio de grande número
de templos católicos, vem provar, de modo insofismável, que o
povo espanhol era católico, porque a religião oficial da
Espanha era a... católica".
Excusez du peu!
665
Ora, é evidentíssimo que se tal ensino católico fosse de fato eficaz, que
se deveria esperar da geração espanhola? Certamente, quando mais não fosse, um
colossal convento, senão, uma legião de sacristãos!
Foi exatamente o contrário que se produziu.
Foram reacionários contra esse pernicioso ensino que escravizara sua
liberdade.
A Igreja Católica quebra lanças para introduzir o ensino do seu catecismo,
porque, em suma, é o único ensino que ela pode administrar a seus discípulos, isto
é, que Deus é Deus, que ele está em toda parte, que é dividido em três pedaços,
que isso e aquilo são pecados, que há céu, purgatório e inferno etc., porquanto, para
as ciências positivas não só a padralhada não teria a necessária competência, como
possuímos, para isso, escolas apropriadas, com professorado leigo competentíssimo
e diplomado.
Jamais, porém, se viu o menor esforço por parte do Catolicismo em
edificar Escolas Públicas, nas quais, com mais propriedade, poderiam ensinar seu
obsoleto catecismo.
O que vemos são edificações de igrejas por toda parte, mas com o
dinheiro dos fiéis, adquirindo por essa forma indireta grande parte do território
nacional como sucedeu com o México. Fazer correr numa localidade suburbana uma
subscrição para a construção de uma Escola é tempo perdido, como já tivemos
ocasião de verificar, em infrutífera tentativa, ao passo que se esta subscrição for
para a construção de uma igreja ou para festejar o Santo padroeiro o resultado
monetário ultrapassa sempre os limites do necessário, queimando-se uma boa parte
em foguetório. Em Niterói já houve até um dia de "florzinha", para se festejar um
bispo e muitos caíram na ariosca pensando que se estava angariando para um asilo.
666
Entretanto, bem podia uma pequena parcela da fantástica renda
produzida pelo Dinheiro de São Pedro que é remetido às dezenas de milhares de
contos para as arcas do Vaticano, ficar aqui e ser destinada à edificação de escolas.
Neste sentido, tivemos a ingenuidade de, acreditando nas boas intenções do
Ministro da Fazenda, José Maria Witaker, dirigir-lhe uma petição em que expusemos
este e outros rombos do tesouro, por onde se escoa o patrimônio nacional e nem
sequer fomos dignos de um simples recado: está entregue! É o que aconselhávamos
a que olhasse esse rombo não com seus olhos de Ministro, mas com os de...
herege.
É expressivo e confere com a época de anarquia mental e governamental
por que atravessa o mundo e principalmente o Brasil. Quem paga imposto para
manter as parcas escolas que possuímos tem o direito de educar seus filhos como
quiser.
Não concordamos, absolutamente, com a opinião do deputado francês La
Cour Grammaison quando alega que o ensino leigo é agressivo aos católicos.
Por que só aos católicos e não aos outros cultos que contêm superior
número de fiéis? Não serão eles tão respeitáveis, ou, mesmo, mais pela sua
Antigüidade?
Não é a instrução do povo que deve atemorizar o Catolicismo; só tirano
ou velhaco é que a teme; mas o que se deve temer é a ignorância que arrasta a
massa aos vícios pelo primeiro agitador social.
Uma geração livremente instruída, sem peias espirituais que cerceiam o
desenvolvimento da ciência, produz outra geração mais esclarecida, a qual, ao cabo
de alguns séculos, pode empunhar o facho da razão e iluminar os povos infelizes
que se deixaram acorrentar ao erro.
667
A influência nefasta do Catolicismo sobre a política e a moral, sobre a
felicidade ou infelicidade dos homens em particular e da coletividade em geral é por
demais evidente para que se entregue a Roma o direito de governar os homens,
modificando-lhes sua ação, sua predileção, seu regime de vida e, principalmente,
degradando-lhe a razão. Ele se apodera do homem logo ao sair do seio materno, de
quem já se havia apoderado anteriormente, preside sua educação, marca-lhe os
limites da ciência, põe-lhe o "visto" nos mais importantes compromissos de sua vida
íntima, rodeia seu leito mortuário, o conduz ao túmulo e o acompanha no além por
algum tempo, se o ajudarem com o produto de missas.
J. Most dizia: "Quanto mais se crê, menos se sabe; quanto menos se
sabe, mais ignorante se é, e quando o homem é ignorante melhor o podem
governar".
O Cardeal Gonsalvo declarou que nenhum católico pode respeitar a
liberdade de culto; mas este pândego quer que os outros respeitem a sua!
Com a encíclica que Pio XI acaba de lançar ao mundo (1933),
protestando contra o governo espanhol a respeito da separação da Igreja do Estado
e outros atos inerentes a essa medida profilática, terminando por excomungar
automaticamente o Presidente Alcalá Zamora (fervoroso católico) e todos os
deputados, saiu-se ele com esta beatífica frase maquiavélica, por demais
transparente de hipocrisia: "Ao amado povo espanhol proclamo que a Igreja se
ACOMODA a todas as formas de governo e de instituições civis, uma vez que
fiquem intactos os direitos de Deus (?) e os da consciência cristã" (aqui não lhe
convinha o termo católica). O que bem interpretado quer dizer, que a Igreja Católica
(e não cristão) se acomoda com todas as formas de governo e instituições civis,
contanto que não se submeta às leis que lhe cerceiem a liberdade de poder abafar a
668
liberdade daqueles que não quiserem se submeter às suas leis canônicas, e possa
exercer desassombradamente o Poder Temporal que ela arranca das mãos do
Poder Nacional. Tanto isso é verdade que, na mesma ocasião, a Pastoral Universal
dos Bispos publicava no El siglo futuro:
"Pais Católicos! (Já não são cristãos). Antes a morte
do que consentir que nossos filhos freqüentem a escola laica.”
“Ainda com as mãos e os pés amarrados, não irão".
"Há absoluta incompatibilidade entre o espírito da
Igreja Católica e um governo liberal seja ele qual for,
republicano ou monárquico. Um padre convencido pode ser
republicano, mas nunca liberal, por pouco lógico que ele seja."
(L. Courdaveaux)
O Catolicismo tem por princípio que a ciência é loucura, que o exame das
coisas é orgulho.
É assim que o Vaticano se acomoda com os governos e as instituições
civis. É a igreja da incoerência e da desfaçatez. Para ela as palavras são como suas
duas espadas, têm duplos sentidos; o que é uma afronta à Razão humana! E é
assim, também, que se acomodam certos adeptos.
Que o Brasil e as nações em que está instituída a liberdade de crenças e
de consciências e aquelas em que a religião se acha ligada ao Estado reconheçam
que o Decálogo é a base fundamental de todas as religiões antigas e modernas e
mandem pintar nas paredes de suas escolas os dez Mandamentos da Lei de Deus,
669
incutindo, desse modo, nos cérebros infantis, os únicos dez artigos dessa lei
sociológica que rege a humanidade, sem que isso possa ferir esta ou aquela crença.
Basta que o homem adore um Deus impessoal, não mate, não roube, não
calunie, não adultere, não cobice o que não é seu etc., e cumpra à risca a
incomparável moral budística, para que este homem se torne verdadeiramente digno
de merecer as graças do Criador, fazendo seu espírito reintegrar na sua própria
essência.
Não são os zimbórios dourados dos templos e as tragédias divinas
representadas neles por homens especializados, que têm conseguido evitar as
guerras implantando a paz na terra.
O contrário é que é verdade.
Casa de Orates
Para provar que vivemos em uma verdadeira Casa de Orates, em que
ninguém se entende, porque cada magnata detentor de uma farpeia do governo
julga estar tudo certo, no seu modo de ver, e pode salvar a pátria e suas próprias
finanças, apresentaremos aqui alguns fatos incontestáveis.
Quando em 1889 o país rompeu com o Poder Espiritual Romano fazia
parte do nosso patrimônio, não só territorial, como em bens móveis, uma fantástica
soma de alguns milhares de contos de réis.
Pela conhecida astúcia jesuítica, essas propriedades pertencem hoje ao
Vaticano, porque provado ficou entre eles que tudo aquilo pertencia a Rodrigues
Alves, então Presidente da República, que entendeu doar a Roma grande parte
desse patrimônio nacional.
670
Nos primeiros meses da República, o povo bestificado, conforme a
expressão de Aristides Lobo, ficou quieto. De repente, porém, vendo a Igreja que os
fiéis começavam a rarear, improvisou um programa de procissões pelas ruas da
cidade, em que se assistiam a bárbaros espancamentos e assassinatos de
estrangeiros ignorantes dos costumes do país. Era o fanatismo católico e intolerante
que, pretendendo fazer uma nova São Bartolomeu, invadia bondes e casas
comerciais, apedrejando, ferindo à navalha e matando pacatos transeuntes que
inconscientemente conservavam seus chapéus na cabeça, embora distantes
dezenas de metros do local das exibições.
Como essas cenas de selvageria se avolumavam de ano para ano, o
governo tomou providências proibindo as procissões. Mas, de ano a ano, de acordo
com a mentalidade do Chefete que dirigia a plebe, as concessões para passear
santos, só em volta do seu templo, foram se desenvolvendo até conseguirem
passear eles, por algumas ruas, chegando mais tarde a rodear as Praças, já que, em
1930, a Cúria Cardinalícia em um raso de suprema autoridade eclesiástica entendeu
Decretar a monumental passeata do ídolo de "Aparecida", como a maior afronta e
menosprezo às leis vigentes.
Protestamos em tempo, por petição ao Ministro da Justiça, Oswaldo
Aranha, e obtivemos como resposta que "estando a Igreja desligada do Estado, o
Governo não podia intervir nessas manifestações públicas."
Pois bem! Três meses depois a Capital da República, com o auxílio e a
presença do elemento oficial, assistia à maior procissão carnavalesca que jamais
o próprio império e a própria Roma viram, e na qual as chapas fotográficas
indiscretas gravaram a cena do Ditador curvado beijando os pés do dito ídolo, sob o
olhar expressivo do Cardeal.
671
E... a Igreja está separada do Estado, diz o Ministro da Justiça! É fácil
calcular o que não seria se não estivesse.
Mas toda medalha tem seu reverso e este é curiosíssimo: enquanto aqui,
na Capital do Brasil, se prestavam homenagens à Cúria Cardinalícia, em Roma, o
povo, nesse mesmo dia, incendiava templos, dava "morras" ao Papa, clamava pela
destruição do Vaticano e o Papa, a toda pressa, reunia um Conclave de 22 cardeais!
Edificantíssimo!
Que vimos na Revolução de 24 de outubro?
S. Ex., o Cardeal, chamado a servir de guarda civil para prender o Chefe
do Poder Constituído, quando isso podia ter sido obtido pelo direito do mais forte,
que assistia, de fato, ao exército naquele momento e representado por três distintos
generais.
Essa intervenção, porém, se deu, não pelo sentimento pacificador que
animava a Cúria Cardinalícia, mas pelo acréscimo, na última hora, no manifesto
lançado à Nação, pela Junta Governativa do artigo 8, que só podia interessar à
Cúria Romana: "Solução da questão religiosa" que, aliás, nunca existiu no Brasil.
E o Presidente saiu na frente do Cardeal!
Outrora, era D. Pedro II, cioso de suas prerrogativas de monarca, quem
mandava prender em fortalezas alguns bispos que o queriam desprestigiar, apesar
de ligada a Igreja ao Estado e ser ele o maior católico do Brasil. Ironia dos tempos!
Que vemos mais na nova República?
Padres nomeados Interventores (isto é, Governadores) como Astolfo
Serra, no Maranhão. Como se nomear para tal cargo indivíduo que nem sequer é
brasileiro, pela poderosa razão de ser súdito romano de S. M. El-Rei Pio XI a quem
672
deve absoluta obediência e ser dispensado de seus direitos civis para com a nação
brasileira?
Que se dizer da isenção do serviço militar dos noviços desse culto, pela
mística razão de não permitir sua religião? Oh! Como então se nomeiam capelães
no Exército?
Não estarão os outros cultos com o mesmo direito, uma vez que se alega
separação da Igreja do Estado?
Como qualificar os atos de um governo leigo que devia ser o zelador das
nossas leis, assistindo oficialmente à solenidade de benzer as espadas, canhões
etc. e batismo de edifícios e até de um cavalo no Ceará (1933) por ocasião da
excursão ao Norte do Chefe do Governo Provisório?
É sabido que o clero pelo interior do país não cessa de combater o
casamento civil sob penas espirituais que apavoram aquelas pobres mentalidades.
Que fazem nossas autoridades ante as infrações das leis policiais e
municipais? Calam-se... porque também são chefetes... e mandam nessa Casa de
Orates.
Decididamente! Parece que não há mais juízo no Brasil, uma vez que se
assistem a fatos dessa ordem, sem um protesto da imprensa em massa.
E, como não ser assim, pois se ela forma um só bloco com uma só pena e
um só sino?!
País dirigido por incoerentes é país desgovernado e país desgovernado é
país anarquizado, caminhando, cedo ou tarde, para seu esfacelamento, pois, onde
não há harmonia de vistas, existe a compressão da oligarquia e o caos da
demagogia.
673
Queda do Romanismo
Segundo Julien Vinson357, o Cristianismo é dividido em cinco períodos
distintos:
1 ° — O da sua formação, de Jesus a Paulo.
2° — O da luta e da propaganda, de Paulo a Constantino.
3º — O da doutrina e do ritual, de Constantino às Cruzadas.
4º — O da dominação e das divisões, das Cruzadas à Reforma.
5º — O da decadência, da Reforma aos nossos dias.
Diz Ch Guignebert358: "O Catolicismo transformado em Romanismo não
pode mais evoluir... tem de decompor-se e desaparecer... e, assim, acabam todas as
religiões que, como os organismos vivos, nascem de uma necessidade, nutrem-se
da morte, morrem da vida pouco a pouco, cada dia, para caírem, por fim, no cadinho
eterno".
"É possível que uma nova religião brote, um dia, daí
que um princípio ativo de revivescência religiosa surja de suas
ruínas; mas, enquanto Catolicismo propriamente dito, isto é,
enquanto considerado como uma das forças históricas
definidas do Cristianismo, seu principal papel parece
virtualmente terminado no mundo. É um grande foco ainda
rubro; mas, que nada alimenta mais, que se extingue
357 Les Religions actuelles — 1888.
358 Christianisme medieval et moderne.
674
lentamente e no qual o frio da morte entrou. Sob toda
aparência o vento do século futuro dispersará suas cinzas".
Benchara Brandford, escritor protestante inglês, em sua última obra Janus
e Vesta, considera o Pontífice romano irremediavelmente caído como Poder
Espiritual.
O barco de São Pedro está naufragando e o Cristo não mais ali está para
amainar a tormenta.
No grande banquete diplomático oferecido ao Papa Pio XI, em 31 de
março de 1930, banquete ao qual Jesus não tomaria parte, antipolítico como ele era,
o Papa, falando aos representantes de 1.200 congregações, salientou que: "O
mundo está cada vez se tornando mais pagão". E ele que o confessa publicamente
é porque já reconhece a próxima débacle do Catolicismo romano, cuja decadência já
vem desde 1757.
Seu temor é tal que, em um discurso aos Membros do Colégio Angélico,
declarou que: "Servir à Igreja no dia de hoje vale mais do que servir a Jesus Cristo".
Querem mais franqueza?
Isso equivale a dizer: Servir ao Poder Temporal, à Política romana, vale
mais que servir ao Poder Espiritual, à Igreja, ao ingênuo nazareno, a Deus em suma!
Por isso, diz A. Bertholet: "No dilúvio das catástrofes históricas, as antigas
religiões e os antigos povos desapareceram. Só Israel manteve firme sua cultura,
sua fé e sua religião através dos séculos, apesar das vicissitudes e dos
contratempos.”
"Uma religião não pode ser destruída por ataques
exteriores, senão quando ela não mais satisfaz às
675
necessidades espirituais de seus adeptos. É o que se passa
com o Catolicismo. O Judaísmo ou Israelitismo foi quem mais
sofreu das perseguições que qualquer outra fé; entretanto, ele
permanece como um dos fenômenos religiosos mais salientes
que há no mundo."
Porque é o inimigo nato da política. Porque Israel é Sinárquico.
Bertholet, porém, esquece de citar o Budismo que, com seus milênios
anteriores a Israel, é professado por duas terças partes dos habitantes da Terra.
A queda do Catolicismo reside exatamente na exaltação do Romanismo.
Damos agora a palavra a Benito Mussolini pouco antes de subir ao poder,
quando profligou o tratado entre o Vaticano e o governo italiano:
"Posto que a Congregação Jesuítica expulsa da
França, afagada na Espanha, floresça impunemente sobre o
belo solo da Itália; apesar de todas as imoralidades dos
colégios católicos que a imprensa vai denunciando, há,
contudo, milhares e milhares de pais de família, imprevidentes
e idiotas, que abandonam sua prole à mercê de gente que na
vida negam, violentam e suprimem a natureza.”
“O perigo congregacionista existe, portanto, para a
Itália e é mais iminente do que se crê.”
“O livro editado pela casa Podrecca & Galantara não
a demonstra.
676
“O autor, Professor G. Merloni, competentíssimo na
matéria, examina, em primeiro lugar, com rapidez, a história da
Igreja Católica, feroz senhora de corpos e de almas, intolerante
e homicida. Ele nos descreve, depois, os instrumentos típicos
da igreja de Roma, que são os conventos, as congregações e
os jesuítas. E com a supremacia dos Jesuítas que a Igreja
pretende opor-se ao mundo e à civilização.”
“É com a Congregação que a Igreja se enriquece; é
com a vida monástica que a Igreja destrói os homens; é com a
escola que a Igreja amolda as almas das crianças ao tipo de
obediência servil, da renúncia voluntária e do fanatismo
intolerante.”
“A França, filha predileta da Igreja, depois de uma
vintena de anos, de regime republicano, se convenceu de que
as congregações, aumentadas em número e potencialidade,
prejudicavam sua existência. Foi uma revelação. A França
popular viu, de um golpe, a imensa tumefação que sobre seu
corpo havia produzido o bacilo clerical; mas notou-o a tempo
para praticar a operação cirúrgica necessária. A luta se travou
a fundo. 'O Espírito da Igreja, por um lado, e pelo outro o
Espírito da Revolução, era indispensável que o mal se
resolvesse, embora tivesse de sofrer até o extremo'.”
“Assim exclamava, em 1898, o Senador Rane.”
“E o mal se resolveu. No mesmo ano Waldeck-
Rousseau pôs em movimento a máquina legislativa contra as
677
congregações políticas e comerciantes. Destas últimas existiam
5.650 que exerciam 138 comércios (alcoóis, produtos coloniais,
farmacêuticos, exploração de banhos públicos, fábricas de
perfumaria e até de pedras falsas). Combes e Clémenceau
continuaram a obra. Hoje Briand defende a escola leiga, que o
clericalismo francês queria enforcar.”
“E na Itália? Temos bons precedentes legislativos.
Por certo que, em 1866, desde Florência, foi promulgada a lei a
respeito da supressão das Congregações religiosas; em 1867 a
supressão das entidades eclesiásticas seculares em todo o
reino e liquidado o Olho eclesiástico de 59 a 60; foi dissolvida
em toda a Itália a Companhia de Jesus e foram confiscados
seus bens. Nesses tempos se ousava lutar contra a arrogância
clerical. Em 1855, Camilo de Cavour declarava em pleno
parlamento: onde há muitos padres reside a miséria. E o
mesmo Victor Emmanuel II, em 1865, convocava a Câmara
para deliberar acerca da supressão das Congregações
religiosas. Mas, depois da tomada de Roma, a burguesia
conservadora de Roma começou a tergiversar.”
“A Lei das Garantias é uma solene abdicação do
poder civil ante o podei eclesiástico. Nessa lei, promulgada em
1871, reconheceu-se sagrada c inviolável a pessoa do Sumo
Pontífice e se lhe concede uma anuidade de 3.225.000 liras
como doação contínua além de outros direitos de menor
quantia.”
678
“Todas as disposições legislativas anticlericais foram
letra morta. As congregações dissolvidas se reconstituíram.”
“Hoje o número é impressionante. Os padres no
recenseamento oficial de 1882 eram 7.191 e hoje são 8.124.”
“As monjas de 28 mil passaram a 31 mil e mais dez
mil noviças. Os conventos são 5.010. Os seminários clericais
durante dez anos aumentaram de 1.342 para 2.078, com mais
55 mil alunos e 100 mil alunas. É um verdadeiro
envenenamento em grande escala. Em Roma as casas
clericais, colégios, conventos e asilos invadiram todas as
demarcações.”
“Os edifícios habitados pelos religiosos são 361 com
um total de 30 mil quartos, que hoje servem a três mil
privilegiados da hierarquia católica. Além das congregações há
um movimento econômico-social dos católicos, digno de relevo
e em contínuo aumento, movimento que abarca sociedades de
socorros mútuos, caixas rurais, usinas rurais, sociedades de
seguro e de assistência.”
“Em 2.783 instituições econômicas estão inscritos
387.706 sócios. Os governos olham com certa simpatia esse
movimento com fundamento conservador e reacionário. Os
capitalistas encontram ali suas vítimas e o governo seus
agentes eleitorais.”
“Depois dessas cifras e desses dados, que deve
fazer um anticlericalismo menos apatetado? Iniciar uma
679
agitação obstinada para obter a abolição do fundo para os
cultos (98 milhões) que poderiam muito bem passar para a
Instrução e a supressão de todas as congregações religiosas.
Em lugar de comemorar os mortos pensemos nos vivos! Já é
tempo!".
Na obra Os Mártires do Pensamento, 1913, escrevia ele:
"Espero que a leitura dessas páginas familiarizará o
público de livres pensadores com a época, a vida e a obra do
mais ignorado dos heréticos do outro lado dos Alpes. Dando
este livro à luz, formulo o augúrio de que ele possa suscitar na
alma do leitor o ódio por qualquer forma de tirania espiritual e
profana, seja teocrática ou jacobina (páginas 7 e 8)".
A grande corrupção da Igreja de Roma, nos séculos XIII e XIV e
sucessivos, até hoje, está plenamente documentada e posta em devida luz. Nenhum
país da Europa se pode considerar imune do escândalo moral dos eclesiásticos.
Em 1919 era este o programa do fascio:
"Queremos o seqüestro de todos os bens das
Congregações religiosas e a abolição das rendas episcopais,
que constituem um enorme passivo para a nação e um
privilégio de poucos.”
680
“Nessa mesma obra lê-se: 'Deus não existe. Se
existe, eu o desafio que me castigue aqui diante de todos. A
religião antes da Ciência constitui um absurdo; em ação é uma
imoralidade; entre os homens é uma enfermidade'. Quando
Pedro dá a mão a César, do amplexo destila sangue humano!"
Assim pensava e escrevia Benito Mussolini na sua obra anticlerical João
Huss, o Verídico quando ainda cavava a vida!
Em seu artigo "Queda do Papismo", publicado em O Paiz, nos dias 13 e
14 de fevereiro de 1929, diz o ex-vigário de Juiz de Fora, Hipólito de Oliveira
Campos: "Com a brecha da Porta Pia, caiu o Poder Temporal do Chefe do
Romanismo; mas o Poder Espiritual com o non possumus de Pio IX e seus
sucessores Pio X e Benedito XV, recusando as propostas do governo italiano, com a
chamada Lei das Garantias, nada sofreu, parecendo até ter crescido entre os
católicos sinceros. Agora, com o acordo entre o Duce e Pio XI pondo termo ao que
qualificaram ultimamente de 'Questão Romana', morre completamente o Poder
Espiritual e desaparece, por uma vez, mesmo entre os católicos mais aferrados o
dogma da infalibilidade papal. Pio XI ganha vantagens políticas, recebe dois bilhões
de liras, um grande latifúndio com muitas quintas e palácios, torna-se um pequeno
rei deste mundo, por especulação de um ditador; mas nos dá o direito de repetir,
com referência à Roma papal o que Juvenal já dizia da Roma paga: "Omnia Roma,
cum pretio".
Caiu! Caiu! A grande Babilônia!
681
Glória ao Rei dos Reis, Senhor dos Senhores, Jesus Cristo, bendito por
todos os séculos... Amém!
Portanto, é racional crer-se que o Vaticano deveria passar agora a residir
no próprio Reino do Céu. Mas o Papa-Rei desse Céu não contava com a peça que
lhe ia pregar seu maior rival, Satanás, Rei do Inferno. Não tardou que entre o Rei do
Vaticano e o Rei da Itália surgisse um conflito motivado pela linguagem insultuosa ao
povo italiano empregado pela Civittá Catholica, jornal oficial do Papa, dirigido pela
Companhia de Jesus. Esse artigo reeditava os antigos princípios adotados pela
Cúria Romana. Eis alguns dos seus termos: “O Estado (a Itália) está sujeito à
jurisdição da Igreja... O Papa pode declarar nulas as Leis Civis... Em toda
divergência entre as potências espiritual e temporal, a Igreja tem a última palavra...
Ela pode resistir à força armada, pela força armada, mesmo recorrendo à
intervenção estrangeira... uma vez que firam os interesses da Cidade do Vaticano ou
do seu Papa-Rei'".
Vai com vistas ao Governo Brasileiro!
A polêmica se azedou e o Popolo di Roma fez um apelo em favor da sua
cessação entre a Santa Sé e o Estado Italiano.
"O Jornal deplora que tão elevada autoridade possa
descer a pronunciar frases que não correspondem ao seu
próprio prestígio, visto como chegam ao exagero. E afirma que
a vigilância sobre as Organizações Católicas, a qual o primeiroministro
Mussolini se referiu, é uma função de Estado
necessária. Depois, o Popolo di Roma salienta: 'Se a
Organização da Mocidade Católica pôde aumentar o número
682
de seus membros para 50 mil o ano passado, certamente não o
teria conseguido se fosse seriamente refreada ou embaraçada
pelo governo'. Querem mais claro?
“O Jornal conclui afirmando que se o Pontífice
desejou implorar a Deus, porque as dificuldades erguidas no
caminho da mocidade católica deram em resultado a sua
multiplicação, por outro lado o Estado italiano que paira sobre
um fato de menor importância, disseminador que ele será dos
rancores e da malevolência que perduram além do que seria
razoável e, pelo tempo bastante, quase, para justificar a
oposição e o ceticismo que as lojas maçônicas levantaram
contra a concordata.”
“O primeiro-ministro Mussolini teve hoje uma longa
conferência com Delvecchio, embaixador italiano junto à Santa
Sé.”
“Acredita-se que a palestra tenha versado acerca da
situação criada entre a Igreja e o Estado pelos últimos
acontecimentos.”
“ ‘Roma, 17 (U.P) — II Lavoro — respondendo ao
discurso do Papa, do domingo, diz o seguinte: Estamos sob a
impressão de que alguém do lado católico está tentando
envenenar as relações do Estado com a Igreja. É difícil
compreender os escopos dessa atividade que não pode trazer
nenhum resultado frutífero e, pelo contrário, terminará em
683
graves perturbações. Há sinais seguros de que o Pontífice está
sendo mal informado a respeito da situação real'."
AS MANIFESTAÇÕES FASCISTAS AXTICATÓLICAS
"Roma — 25 — O Osservatore Romano iniciou
recentemente uma coluna especial para registrar as
manifestações anti-católicas por parte dos fascistas. Diz esse
jornal que estudantes fascistas queimaram seus exemplares de
sábado, contendo o discurso do Papa à Universidade Católica
da Itália. Acrescenta que os fascistas gritavam: Abaixo o Papa!
Morra o Papa! Em represália, o Lavoro Fascista começou
também a publicar uma coluna com as manifestações católicas
antifascistas, acusando os párocos de vários lugares de pregar
abertamente contra o fascismo.”
“O Osservatore Romano assegura que nem a polícia
nem as autoridades da Universidade de Roma intervieram para
impedir as demonstrações de sábado contra Sua Santidade.
Nessa ocasião, os fascistas feriram um olho e fizeram saltar os
dentes de um estudante católico, em frente à Universidade
Romana, porque o rapaz se recusou a tirar da lapela o
emblema de estudante ex-católico. — (U. R)".
684
MANIFESTAÇÕES ANTIFASCISTAS
O Lavoro Fascista acusa o clero de tê-las provocado
"Roma, 23 (H) — O Favoro Fascista publica nova
lista de manifestações antifascistas provocadas pelo clero em
várias regiões do país e confirma, em editorial, as acusações
que formulou contra a Ação Católica italiana, a qual, diz o
Jornal, constatando a impossibilidade de romper o Fascismo,
tenta agora tomar de assalto o Estado Fascista.”
“ 'Todas as responsabilidades do que acontecer,
acentua o Lavoro Fascista, recaem sobre as organizações
católicas porque o Estado Fascista criou o Estado Italiano, e o
novo Estado do Vaticano reconheceu o Catolicismo como
religião do Estado e agiu sempre de absoluta conformidade
com os princípios católicos, mas não pode admitir a
subordinação do Estado à Igreja e ainda menos consentir a
subordinação na organização de forças opostas ao Estado que
não é anticlerical.”
Ser católico não quer dizer que se deve tolerar o
anti-fascismo das organizações católicas'".
Ora, esses fatos acabam de passar-se na própria sede do Catolicismo.
Quererão nossos deputados à Constituinte (1933), simplesmente para
agradar ao Santo da sua devoção, acorrentar de novo a nação até então libertada,
ao pelourinho romano, criando, como se está criando em um ambiente apaixonado e
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por demais expressivo a Questão religiosa que nunca existiu no Brasil, fechando os
olhos e cerrando os ouvidos à própria História?
Que o espectro do Rui Barbosa, embora invisível ali, seja o guia menu.
dos verdadeiros brasileiros patriotas, não sujeitos a uma nação estrangeira como
soa ser o Vaticano com seu Rei dos Reis — Pio XI!
Que sirvam de exemplo ao Brasil, além dos que futuramente se forem
desenrolando pelo mundo afora, até o dia em que o dedo da Providência, com: na
batalha do Marne segundo Gustave Le Bon, escrever na Cúpula do Vaticano: Basta!
Se até aqui o barco de São Pedro pôde resistir aos vendavais, é duvidoso
que ele possa enfrentar o futuro ciclone, provocado pela política do seu pessoal.
Catolicismo Pagão
Não é mister argúcia para se deduzir dessas discussões que o vigário de
Cristo poderá tratar de tudo quanto diga respeito ao mundanismo, menos, porém, ao
espiritualismo.
Se compararmos o complicado aparelhamento necessário ao
funcionamento de uma nação, possuindo ministérios e repartições apropriadas a
determinadas funções e uma legião de funcionários, com o colossal mecanismo que
deve requerer o Vaticano, que reúne em si todas as repartições eclesiásticas das
nações do globo, simples auxiliares ou filiais da sua central em Roma. fica-se
perplexo e a imaginação indaga se é possível sobrar alguns minutos ao Papa para
tratar de questões espirituais.
Se em uma das nossas mesquinhas repartições públicas a mais simples
pretensão perde-se no labirinto burocrático, dando que fazer ao solicitante para
descobri-la ao cabo de alguns meses, fácil é de imaginar o que deve ser no
686
Vaticano, onde petições ou cartas do mundo inteiro levam anos ou mesmo nunca
chegam às mãos do Chefe, conforme é desvendado no atual processo eclesiástico
do jesuíta Bremer, já citado. É verdade que não há máquina administrativa, por mais
emperrada que esteja, que resista a uma boa almotolia, munida de óleo fino...
benzido, já se vê.
A espiritualidade ali é como espírito engarrafado para uso externo.
O culto católico, como sobejamente já temos provado, tem por princípio a
Política, por meios o embuste e a astúcia e por fim a obtenção do Poder Temporal
Mundial.
O Cristo é o pretexto, a cruz — a tabuleta comercial, o altar — o balcão e
o clero — o funcionalismo desse colossal empório, que é o Vaticano.
Tudo ali é puro Paganismo; tudo ali é contrário à doutrina do Cristo,
começando pelo próprio templo, condenado pelo Rabino e confirmado pelos
Apóstolos, em Atos, até o mais comezinho instrumento do culto. Tudo é cópia das
mitologias, do Ocultismo e da magia negra.
São Clemente, de Alexandria, um dos mais venerados sábios da Igreja, já
havia dito que "o Cristianismo era o Paganismo* com seus 'mistérios' e ritos pagãos,
iniciação, epopsia, hierofania, grandes e pequenos mistérios. A ligação viva entre
Paz e Cristo, diz ele, está na razão de mãe para com o filho; mas a parteira, dona
Teologia, fez o trabalho tão mal, que a mãe morreu e o filho ficou em perigo até
hoje".
São Tertuliano, São Justino e muitos outros apologistas da religião cristã
admitiam que "a religião de Zoroastro já possuía sacramentos, batismo, penitência,
eucaristia, consagração com palavras místicas, que os iniciados marcavam a fronte
* N. do E.: A respeito de Paganismo, sugerimos a leitura de Paganismo — Uma Introdução da
Religião Centrada na Terra, de Joyce e River Higginbothan, Madras Editora.
687
com um sinal sagrado (como se faz no Krishna) aceitavam o dogma da ressurreição
de Mitra, que seu pontífice não podia ser casado várias vezes, que tinham virgens e
lei de continência etc."
Diz ele mais que "as práticas do primitivo Cristianismo denotavam
semelhança com a doutrina de Zoroastro, que os cristãos do Ocidente voltavam-se
para o Oriente a fim de orarem e que todos os seus templos eram voltados para o
sol nascente. Descansavam ao domingo porque era o dia consagrado ao sol".
Na Grécia, quando se celebrava em honra ao deus Baco, as mulheres
invocavam o Cordeiro. Os católicos invocam o Cordeiro.
Nessas cerimônias os sacerdotes carregam o cofre que continha o
coração de Baco. Os católicos, na quinta-feira Santa, carregam o cibório contendo o
corpo de Cristo.
Baco, como Cristo, tivera suas iniciações. Os iniciados esperavam seu
último advento, como os cristãos esperavam o de Cristo.
Amiano Marcellino, Procópio e São Cirilo citam que se chorava a morte do
deus Adônis, ferido por um javali; mostrava-se ao povo a larga chaga, como se
mostram as chagas de Cristo.
O Adônis dos fenícios, o Adoneus dos árabes e o Adés dos gregos é o
mesmo deus do Sol.
Moisés, firmado no Zoroastrismo, no Bramanismo, no Budismo e em
outras religiões antigas que ele mesmo declara conhecer, condenou templos,
imagens esculpidas e sua conseqüente idolatria. Jesus, indubitavelmente, confirmou
Moisés; mas o Catolicismo, por desaforo, serve-se da sua própria imagem como
supremo símbolo de idolatria, e completa o panteão com a de sua mãe e uma legião
de santos e santas para cada especialidade milagreira, como fazia o Paganismo
688
Romano, conforme já vimos, que tinha até o Santo da Estrumeira como o nome de
Esterquilino.
Era o Saturno para a semeação, o Consus para a colheita, o Ceres para
o crescimento, o Flora para as flores, o Pomana para o pomar, o Vervactor para a
primeira lavragem, o Redarator para a segunda, o Messor para a ceifa, o
Convector para a colheita, o Tessoma para a fadiga etc.
Os pagãos davam nomes de deuses às localidades, como patronos.
Entretanto, cidades com o nome do Espírito Santo, parcela de Deus e de santos e
santas da hagiografia católica pululam pelo mundo inteiro.
As orações dos pagãos são consideradas como encantações mágicas,
tanto mais eficazes quanto maior for o número de divindades invocadas. E que são
as orações do Catolicismo, senão encantações, tanto ou mais eficientes, quanto
maior for o número de santos invocados, pois, como já tivemos ocasião de citar, eles
têm crédito na Corte Celestial?
Que são as medalhas de santos, senão os talismãs do Ocultismo? Em
que serão aquelas mais eficazes que estes? A água benta é a água lustral do
Ocultismo. Os exorcismos e as encomendações de mortos são reproduções das
mesmas práticas de magia negra, em que o hissopo e o incensório, petrechos
mágicos, rodeiam o corpo com misteriosos círculos de fogo e água benta, tal como
praticavam os Auguros nos mistérios de Elêusis, tudo acompanhado de fórmulas
cabalísticas, ditas hoje em latim. Ambos ofereciam em nome de Deuses e das
potências divinas.
As figas bentas, escapulários, etc. são outros tantos amuletos da magia
negra e do Lamaísmo.
689
O papa Sixto IV, em 1471, chegou a inventar carneirinhos de cera, que se
enterravam para livrar de malefícios, bruxarias, incêndios, naufrágios, tempestades
etc. tal como se faz nos sertões da África e mesmo no nosso país, entre gente culta
e nos candomblés!
Que é o rosário senão uma imitação aperfeiçoada do "Moinho de Rezas'"
do Lamaísmo Tibetano?
Que livro lê o padre na missa? A Bíblia; que, ato contínuo, ele condena e
atira na cara de um protestante.
Quais seus hábitos talares? Os mesmos usados pelos grandes
sacerdotes do Egito, do Tibete etc.
Citemos uma cena do ritual católico praticada pelo papa, no ato da
canonização de um santo:
"O papa sentado em seu trono recebe das mãos dos
cardeais dois pães, um pequeno barril de vinho, três velas de
cera, duas pombinhas e alguns passarinhos presos em uma
gaiola feita de fios de prata. O papa abre a portinhola, tira um
pássaro e o solta".
Não se parece isso com uma cena das nossas macumbas? E a saída do
purgatório de uma alma para o céu! Só falta substituir o órgão pela cuíca.
Se esta cena se produzisse no nosso país, a canoa policial não
demoraria em remover sacerdote e bugigangas para o xadrez; mas o ato passa-se
no templo de Roma.
690
As procissões, as preces ao santo especialista, para chover ou deixar de
chover, contra as epidemias, para ganhar uma guerra matando seu semelhante,
para arranjar casamentos ou descobrir objetos perdidos, para ter filhos, para quebrar
ciúmes ou quebrantes etc., que são senão exata reprodução da magia negra?
Como os mágicos ou feiticeiros, ele se diz o depositário dos segredos do céu e do
inferno, e, colocando-se entre o homem e Deus, ele esmaga aquele com o
formidável peso do seu Poder.
Toda a administração do Universo, diz Dupuis, era composta de uma
multidão de inteligências, denominadas, conforme os dialetos, por anjos, deuses,
heróis, izeds, gênios etc. Cada qual tinha uma função particular, seja sobre a chuva,
a seca, o calor, o frio, a lavoura, os rebanhos, as artes etc. Entre os persas era Bad,
o nome do anjo que preside aos ventos; Mordad era o anjo da Morte; Aniran preside
as bodas; Fervadin é o anjo do ar e dos ventos, Kurdat, o anjo da terra e dos frutos.
Os cristãos copiaram essa hierarquia dos persas e caldaicos. Orígenes
refere-se ao anjo da vocação dos gentios, ao anjo da Graça. Tertuliano fala do anjo
da prece, do anjo do batismo, do anjo do matrimônio, do anjo que preside a
formação do feto. Crisóstomo e Basílio celebram o anjo da paz. Em cada planeta os
cristãos colocaram um anjo para guiá-lo. No Apocalipse as plêiades são chamadas
sete anjos. Seria interminável se fôssemos citar a angelolatria do Catolicismo,
genuíno culto idolatra.
Nunca Jesus ou seus apóstolos instituíram o mínimo ritual ou o mínimo
dogma. Como, pois, uma Igreja, que pretende ser a arca sagrada da palavra do seu
fundador, age de modo tão diametralmente oposto?
Atualmente o católico não mais vive da espiritualidade da Igreja, mas sim
da materialidade na igreja.
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A Igreja Católica é um estabelecimento ao qual se vai quando se
necessita de certos socorros e é por isso que, aparecendo pela exterioridade e pela
imposição orgulhosa, todos se sentem coagidos e constrangidos com seus decretos,
assim disse Karl Adam. grande apologista católico, professor em Tubingen.
O cristão não sabe se deve respeitar os dons de amor e de perdão com
que Jesus dotou sua doutrina ou se deve se apavorar ante os anátemas e as
fogueiras que o Catolicismo criou.
Pelo interior do país, então, assiste-se, como nos foi relatado por um
ministro plenipotenciário de uma nação européia, a cenas do seguinte jaez: "Um
sertanejo, premido em frente de uma igreja para satisfazer certa necessidade
fisiológica, após um momento de indecisão e de reflexão, tirou o chapéu
respeitosamente e, encostando-se na parede do templo, realizou seu mais ardente
desejo, tornando a saudar o dono da casa, compenetrado de que agira
diplomaticamente com ele".
Não é ajoelhando-se perante a imagem do Cristo pregado a uma cruz,
nem lhe comendo a carne ou lhe bebendo o sangue que demonstramos ser
cristãos.
Não é submetendo-se cegamente a um código terrorista forjado pela
política romana, então predominante, que o católico provará ser verdadeiramente
cristão.
É discernindo o veneno que existe na confusão dos termos Religião e
Culto — Cristianismo e Catolicismo.
É cumprindo à risca a doutrina social de Moisés que o Cristo pregou e
pondo em prática a moral e os virtuosos temas budistas que ele tornou conhecidos.
692
É não matando, não roubando, não cobiçando a mulher alheia nem os
bens de seu semelhante, não caluniando, não desejando o mal a outrem, é nos
amando mutuamente, como parte integrante do mesmo reino hominal e adorando o
Criador em espírito e verdade, como mandou Jesus, que o Reino de Deus, voltaria,
como nos tempos patriarcais, podendo-se então espetar no pólo norte a bandeira
branca com o seguinte letreiro: Reino do Céu.
Rituais, cerimoniais, liturgias, dogmas, sacramentos não passam de
mistificações à credulidade pública, fascinada pelas encenações teatrais e pela lábia
dos mesmos fariseus, que o Rabino não cessava de chicotear com seu divino verbo.
Marcos VIII, 15, diz: "... guardai-vos do fermento dos fariseus e do
fermento de Herodes", isto é, fugi da lábia do clero e da política papal.
Quando o púlpito de uma igreja se transforma em tribuna política, nela o
orador faz ouvir, não o verbo de Deus, nem mesmo a palavra de amor de Jesus.
contrário como ele era à política romana; mas a voz tonitruante de Nemrod. Princípio
do Mal, o militarismo desorganizador da paz mundial. Em vez de chamar do púlpito a
humanidade à paz, ele a incita, pelo contrário, à guerra, benzendo as armas
assassinas que terão de matar outros católicos!
Paganismo, mas, não Cristianismo é que é o Catolicismo!
Preces
Aléxis Mallon, apologista católico, na obra Christus de Joseph Huby.
página 659, citando duas orações dos egípcios, assim se exprime: "Comparadas
entre si e completadas uma pela outra, as esteias da necrópole tebana dão uma
notável idéia de como eles compreendiam a bondade divina. Deus, dizem eles, é
poderoso, cuida de suas criaturas, mas se ocupa especialmente do homem. Ele o
693
socorre nas suas necessidades e atende às suas preces. Ele é particularmente bom
para o aflito, que o invoca; incorruptível, ele é melhor auxiliar do que os homens. Por
isso todos o amam e têm confiança nele. Mas o homem, por sua natureza, é levado
ao pecado, age como um insensato, não distinguindo o bem do mal e Deus o castiga
por suas faltas. Deus pune o mau. o perjuro, pela doença, pela cegueira, por isso se
deve temê-lo. De resto. Deus é clemente por sua própria natureza e sua cólera é de
pouca duração.”
“Esses admiráveis sentimentos devem reerguer aos
nossos olhos este pobre povo curvado sob a idolatria.”
"Idolatria! Teremos nós o direito de pronunciar
este termo degradante, à vista dos magnânimos surtos de
confiança e de amor por um Deus tão nobremente
compreendido?" (O destaque é nosso).
Pierre de Bruys, sacerdote católico, propagava que a salvação do homem
depende unicamente dos seus méritos pessoais; obras e sacramentos são inúteis e
ilusórios. Deus ouve as preces dos justos ou dos criminosos de onde eles as
formulam; não precisam dirigi-las de uma igreja; e, por ter assim falado de acordo
com a própria recomendação de Jesus, este santo homem, os representantes desse
Deus de amor, o queimaram vivo em Saint-Gilles, em 1126.
No entanto, eis a única religião, o único culto digno do Criador, religião
simples, sem aparato, ritos ou cerimônias, porque o Templo reside na própria alma
do homem e dispensa, portanto, sacerdotes ou procuradores incumbidos, mediante
tabela de preços, de remoerem entredentes meia dúzia de fórmulas em língua
694
morta, enquanto o outorgante, talvez, esteja alheio ao ato ou praticando coisas
contrárias à religião.
Nas portas desse Templo não há vendilhões apregoando galinhas,
leitores e bugigangas ao som de um jazz-band tocado por desafinada charanga.
Ali não se vendem orações, indulgências, talismãs e inesgotáveis
pedaços da cruz, pregos, etc. Jesus disse bem claro: "Quando orardes, entra no teu
quarto e fechando tua porta ora a teu pai que está oculto (não é ele, é bom reparar);
e teu pai que vê ocultamente te atenderá" (Mateus VI, 5).
Para Platão, cuja doutrina foi a do primitivo Cristianismo, as preces, as
oferendas, os sacrifícios, a que chamam sinteticamente — Santidade — é um
comércio. Orar a Deus é pedir: sacrificar a Deus é dar. Logo, a Santidade é a ciência
de dar o que lhe agrada e de pedir o que nos convém.
Se tudo isso se passasse no segredo da alma de cada um, ainda seria
desculpável; mas para este ritual criou-se a legião de padres que procuram
convencer a plebe de que só eles têm poderes especiais, concedidos por Deus, para
receber as oferendas e servir de intermediários no pedir. Aí reside o ponto
vergonhoso do comércio.
Frederico, o Grande, rei da Prússia, protetor e amigo de Voltaire, dizia ao
clero católico que no seu reino cada um tinha o direito de ir para o céu pelo caminho
que quisesse e escolhesse.
O tráfico das coisas sagradas, a venda das indulgências, as graças, as
beatificações, as canonizações, a impudência da Simonia e de todos os
vergonhosos recursos do Santo Ofício, cujo tesouro pontificai percebe as rendas, o
comércio dos favores celestiais, os milagres e o próprio céu vendido a retalho pela
695
terra, oferecem uma série de quadros fecundos, traçados de tal modo que excitam o
riso ou provocam a indignação de um verdadeiro discípulo de Cristo.
Platão, discípulo do divino Sócrates, herdeiro da tradição de Pitágoras,
Orfeu e Rama, citava a seguinte oração de um poeta como modelo de bom senso e
de razão:
"Concede-me, Pai, o que me é necessário,
Embora eu pense ou não em t'o impetrar.
E, se o que te pedir, me for contrário,
Digna-te, Senhor, oh!... rogo não m'o dar".
Segundo Voltaire, "o Eterno é senhor dos seus desígnios desde a
eternidade. Se a oração está de acordo com suas vontades imutáveis, é inútil pedirlhe
que resolva o contrário. Se o rogarmos de fazer o contrário do que ele resolveu,
é rogá-lo que seja fraco, leviano e inconstante; é crer que ele assim seja; é rir-se
dele”.
“Se pede coisa justa que ele deva conceder, ela se
realizará sem ser necessária a súplica; é mesmo desafiá-lo
com a insistência empregada; se a coisa é injusta, então é
ultrajá-lo”.
“Em suma, a oração é feita a Deus porque o fizemos
à nossa imagem. O tratamos como se fosse um Paxá ou um
Sultão a quem se pode irritar ou abrandar."
696
Dizer-se que Deus é infinitamente bom e misericordioso, mas que só
atende sua criatura quando esta o solicita por meio de preces ou oferendas,
servindo o padre de intermediário, é simplesmente irrisório e contraditório, porque é
inadmissível que Deus modifique a cada instante seus decretos só para servir os
interesses de um suplicante.
Os que pensam que, por meio de Receitas Infalíveis, orações, talismãs,
água benta etc., possam salvar sua alma são os maiores inimigos de Deus.
A prece que católicos dirigem a Deus e a seus santos é eivada de
interesses materiais. O culto não passa de um comércio de troca.
Quem pretende purificar ou santificar sua alma não precisa ir ao templo
ajoelhar-se. A regeneração da alma se obtém mesmo de pé, sem incenso, serr.
preces litúrgicas, no templo espiritual que em nós reside, no qual a luz brilha tanto
que chega a ofuscar as imagens.
Era hábito dos cristãos voltarem-se para o Oriente a fim de orarem, pois
pensavam, segundo relata Casali na página 213, que seu Deus habitava o Oriente,
ao passo que o Ocidente era habitado pelo diabo.
O Oriente era a luz e o Ocidente as trevas.
Seus templos eram todos construídos com a frente para o Oriente, de
acordo com os templos do Paganismo.
Era tão arraigada essa prática que até queriam que seus cadáveres
fossem enterrados com a face voltada para o Oriente. São Leão, cerca de 443 da
nossa era, censurava o povo por usar de tais práticas.
A única prece que Jesus ensinou e que o homem deve repetir
diariamente, com firme propósito de cumpri-la, é a seguinte: Esta prece é uma
adaptação da de Zoroastro (veja Vendidah Sadé).
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"Pai nosso que estais no Céu
Santificado seja vosso nome,
Venha a nós o vosso reino,
Seja feita a vossa vontade,
Assim na terra como no céu,
O pão nosso de cada dia nos dai hoje,
Perdoai as nossas dívidas,
Assim como nós perdoamos aos nossos devedores,
Não nos deixeis cair em tentação,
Livrai-nos, Senhor, do mal".
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
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